Novas regras editadas pelo Governo Federal para evitar demissões em massa

Entenda como as Medidas Provisórias 927/2020 e 936/2020 modificam as regras nas relações de trabalho e empregos durante a pandemia do novo coronavírus.

Samasse Leal | 20 de Abril de 2020 às 16:54

cifotart/iStock -

As Medidas Provisórias que modificam regras nas relações de trabalho e emprego são a MP 927/2020 e a MP 936/2020. As regras criadas pelo Governo Federal no final de março e início de abril, por meio de MPs, foram criticadas. Elas flexibilizam direitos dos trabalhadores para evitar sua demissão. Agora, a contenção de demissões se mostra a melhor medida preventiva para manter empresas abertas. A expectativa é que os postos de trabalho que forem perdidos agora não sejam retomados nem mesmo no longo prazo.

Dados mostram o tamanho do problema

Antes da decretação de pandemia pela OMS, o Sebrae realizou uma pesquisa sobre empregos no Brasil. Aquela pesquisa, de fevereiro, apontou que 54% dos empregos formais no Brasil eram gerados por micro e pequenas empresas. Quase a metade (41%) desses empregos com carteira assinada estava concentrada no setor de comércio. Com a decretação de pandemia pelo Coronavírus em 11/03/2020, veio o isolamento social. A medida adotada em todo o país para conter o contágio e expansão da doença atingiu em cheio esse setor.

O período de isolamento ainda não completou 02 meses, mas já é muito preocupante do ponto de vista econômico. Uma pesquisa realizada pela XP Investimentos aponta que o caixa de pequenas empresas suporta no máximo 30 dias sem faturamento. A pesquisa reuniu 392 empresas de todos os portes. Dentre as micro e pequenas empresas, 41% responderam que suportam no máximo 30 dias de suspensão de suas atividades. Outra pesquisa, do Centro de Estudos de Mercado de Capitais da Fipe (Cemec-Fipe) foi realizada com empresas de capital aberto. Elas possuem maior porte, mas apenas metade delas consegue pagar fornecedores e empregados sem faturar por no máximo 03 meses. Neste estudo foi analisado o balanço social publicado de 245 empresas. Ambas as pesquisas foram realizadas no final do mês de março.

Ambos os estudos comprovam que as regras trazidas pelas MPs são no mínimo necessárias para conter uma enorme recessão. O objetivo é conter o desemprego que poderá ser gerado pelo período de isolamento que não será inferior a 03 meses.

Vale lembrar que além dessas medidas, o Governo permitiu o acesso a mais um saque do FGTS. Além disso, o Governo Federal também laçou um programa assistencial a pessoas sem emprego formal: o Auxílio Emergencial. Todas essas medidas combinadas visam assegurar o consumo e os empregos durante o período de isolamento pela pandemia.

O que determina MP 927/2020?

Ela foi editada em 22 de março de 2020 trazendo medidas emergenciais para assegurar o isolamento por empregados. É ela que reconhece o estado de calamidade pública. A MP 927 adota o mesmo princípio que foi adotado na recente reforma trabalhista. Ela estabelece que o acordo individual escrito prevalece sobre as leis trabalhistas e convenções coletivas de trabalho, em casos específicos. É o que acontece no caso do teletrabalho, por exemplo. De toda forma, não pode haver violação aos direitos previstos na Constituição Federal. Veja a seguir as novas regras de flexibilização dos direitos trabalhistas trazida pela MP 927/2020.

1 . Migração para o teletrabalho ou home office

Essa medida não é novidade, mas foi regulamentada de forma mais clara. Agora o empregador precisa notificar o empregado com 48hs de antecedência sobre essa migração. Isso mesmo, o empregado recebe uma notificação. Não depende de aceitação. As regras do home office devem ser combinadas entre empregador e empregado, mas a empresa deverá fornecer equipamentos. O empregado pode negociar uma ajuda de custo para pagamento de conta de energia elétrica por exemplo. Suprimentos como papel e tinta para impressora também podem ser solicitados. Esses valores não serão considerados como salário. Assim, não conta para as regras de benefícios como recolhimento de FGTS, cálculo de férias, horas extras, 13º salário, etc;

2 . Antecipação de férias individuais

Também depende de notificação com 48hs antecedência. E da mesma forma, não depende da concordância do empregado. Nesta medida, devem ser priorizados empregados que se enquadrem nos grupo mais vulneráveis à doença. São eles: diabéticos, cardíacos, pessoas com doenças respiratórias crônicas como asmáticos, etc. Neste caso, o empregado não receberá a antecipação de férias. O pagamento poderá ser efetuado até o 5º dia útil do mês subsequente ao do período de férias. O pagamento do adicional sobre férias (o terço constitucional) poderá ser pago até o dia 20 de dezembro de 2020. Juntamente com o 13º salário;

3 . Férias coletivas

Também poderão ser concedidas no prazo de 48hs, sem necessidade de comunicação prévia aos sindicatos e órgão local do Ministério da Economia. Seguem inalteradas as demais regras sobre férias coletivas de cada categoria;

4 . Suspensão de férias de profissionais de saúde

E também de licenças não remuneradas que são comuns para profissionais que decidem participar de pesquisas científicas. Também depende de notificação prévia com 48hs de antecedência. Esses profissionais que atuam na linha de frente do combate à doença também poderão ter sua jornada de trabalho ampliada. Nesse caso, a compensação deverá ser feita em até 01 ano e meio;

5 . Antecipação de feriados

Inclusive dos feriados religiosos, sejam eles federais, estaduais ou municipais. Esses dias de descanso poderão inclusive ser utilizados para compensação de bancos de horas. Mas no caso de feriados religiosos, a antecipação depende da concordância do empregado;

6 . Postergação do recolhimento do FGTS

Essa foi uma das medidas mais importantes para ajudar financeiramente as empresas. Essa medida pode ser adotada inclusive para evitar a redução do salário proporcionalmente à redução da jornada de trabalho. O recolhimento do FGTS corresponde a 8% sobre o valor do salário de cada empregado. O empregador pode deixar de recolher para a CEF as parcelas referentes aos meses de março a junho de 2020. O recolhimento deverá ser feito a partir de julho, e os valores das dos meses suspensos podem ser pagos em 6 parcelas. Não haverá incidência de multa ou encargos;

7 . Suspensão de exigências em segurança e saúde no trabalho

Como os empregados estarão em isolamento em casa, não é razoável que se apresentem para realização de exames periódicos. Tratam-se dos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares. Essa regra se aplica durante o período de isolamento, após esse período os cronogramas de saúde ocupacional poderão ser retomados. Logicamente os profissionais de saúde estão sujeitos às regras de segurança e medicina do trabalho impostas pelas unidades de saúde. O único exame que permanece obrigatório é o demissional;

8 . Compensação de horas em regime especial

As horas do banco de horas poderão ser consideradas para compensação de período de dispensa de empregados mediante acordo escrito. A compensação de horas deverá sempre respeitar o limite de 02 horas diárias, previsto na Consolidação das Leis do Trabalho – CLT.

O que determina MP 936/2020?

Ela foi sancionada em 01 de abril de 2020 e não foi mentira de 1º de abril. Ela trata da suspensão do contrato de trabalho e possibilidade de redução da jornada com a consequente redução do salário. Na verdade, as regras impedem a demissão de empregados na medida em que asseguram uma redução na jornada. Imagine o cozinheiro do restaurante que passou a vender comida pelo telefone. O volume de vendas do restaurante caiu. Agora ele só vende pedidos para o jantar. Se o cozinheiro passar a trabalhar menos horas e ganhar menos, poderá não ser demitido. Veja a seguir as novas regras de flexibilização dos direitos trabalhistas trazida pela MP 936/2020.

1 . Redução da jornada e do salário proporcionalmente

A redução pode ser de 25%, 50% ou 70% das horas trabalhadas. Consequentemente, do salário pago por essas horas que deixarem de serem trabalhadas. A redução da jornada de trabalho e consequentemente do salário proporcional depende de acordo entre empregador e empregado. Assim, depende da concordância do empregado. O que não pode ser esquecido é que o valor da hora trabalhada não pode ser reduzido. Desta forma, fica claro que a regra não permite a redução de salário.

É assegurada também uma estabilidade no emprego pelo mesmo período que durar a redução da jornada. Se a redução durar 03 meses, não poderá ser demitido nos 03 meses seguintes ao retorno da jornada integral. Desta forma, se o empregador decide não demitir e reduzir a jornada, o empregado tem 06 meses de emprego assegurado. Além disso, se o restaurante consegue se manter funcionando após o período de isolamento, o posto de trabalho foi preservado;

2 . Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda

Ele é previsto para os casos em que ocorrer a redução da jornada e do salário proporcionalmente. De acordo com este benefício, o governo pagará um percentual do seguro desemprego de acordo com o percentual reduzido na jornada e no salário. Se ao final do período de redução da jornada, ainda assim ocorrer a demissão, o seguro desemprego é assegurado integralmente;

3 . Suspensão do contrato de trabalho

Os contratos de trabalho poderão ser suspensos por até 60 dias. O que isso significa na prática? Que o empregado poderá ficar até 02 meses sem receber salário pelo empregador e sem trabalhar. Porém, todos os benefícios como plano de saúde, vale alimentação e refeição, seguro de vida e acidentes pessoais são mantidos. Além disso, o empregado receberá o seguro desemprego integralmente pelo período que o contrato ficar suspenso. Isso significa que não ficará totalmente sem renda pelo período.

Caso seja demitido após esse período, terá o seguro desemprego assegurado sem nenhum desconto ou alteração. Ao final da suspensão do contrato de trabalho, o empregado retorna às atividades normalmente e recebimento normal do salário. Se por algum motivo o empregado exercer alguma atividade para o empregador, a suspensão do contrato é cancelada imediatamente. Há ainda uma limitação a essa alternativa para empresas que em 2019 tiveram Receita Bruta superior a R$ 4,8 milhões. Elas somente poderão suspender contratos pagando uma ajuda de compensação mensal ao empregado de 30% do valor do salário. Então, nesse caso o empregado receberá 70% do valor do auxílio desemprego.

4 . Rescisão do contrato durante a suspensão ou redução de jornada

Sendo o objetivo do Governo Federal justamente evitar a demissão, caso ela aconteça, o empregador será punido. Acreditamos que a intensão é evitar que o empregador se utilize dessas medidas de emergência para restringir direitos de empregados. Não faz sentido a adoção dessas medidas se a empresa não enfrentar necessidade durante o período de crise pela pandemia. Assim, o empregador que demitir deverá pagar além da verba rescisória uma indenização no mesmo valor do percentual dos acordos. No nosso exemplo, caso o cozinheiro seja demitido, receberá a rescisão e mais o salário que tinha direito durante o período de garantia do emprego. A indenização só não será paga se o próprio empregado der causa à sua demissão. Ou seja, nas hipóteses de justa causa ou se ele mesmo pedir a demissão.

Vale lembrar que a redução da jornada de trabalho com redução proporcional de salário já era possível anteriormente a MP. Contudo, não eram assegurados ao empregado os direitos à estabilidade e nem às indenizações que foram previstas pela MP 936/2020.