Dê adeus ao “Amanhã eu faço”!

Olhar a pilha de contas a pagar sempre deixa Giuseppe Del Giudice ansioso e inquieto. Com muita frequência, ele larga a papelada e varre o chão ou assiste

Redação | 1 de Agosto de 2020 às 01:01

© BrianA Jackson/istock -

Olhar a pilha de contas a pagar sempre deixa Giuseppe Del Giudice ansioso e inquieto. Com muita frequência, ele larga a papelada e varre o chão ou assiste à TV, esperando até o último momento para fazer os pagamentos. Às vezes, paga multa por atraso por causa do hábito de adiar as coisas, mas em muitos aspectos o preço emocional é pior.

“Quanto mais tempo demoro para pagar as contas”, diz Giuseppe, de 58 anos, “mais a ansiedade aumenta.”

Somos todos procrastinadores

“Faz parte da condição humana”, explica Tim Pychyl, pesquisador dessa atitude de procrastinação e professor de Psicologia da Universidade Carleton em Ottawa, Canadá. “Um dos modos de lidar com as coisas é evitá-las, e a procrastinação se resume a isso: queremos nos sentir bem agora. E o jeito de conseguir é evitando a tarefa.”

É possível procrastinar em quase todas as situações, até com tarefas agradáveis como planejar as férias. “Alguns procrastinam a faxina. Outros procrastinam fazendo faxina”, conta Piers Steel, professor de Administração da Universidade de Calgary, em Alberta, Canadá.

“Quase todo mundo procrastina o testamento”, diz Steel. “Quando morrem, 70% a 80% das pessoas não têm testamento ou o testamento está incompleto ou desatualizado. Isso causa situações terríveis.” Mas, na verdade, a morte não é o supremo gatilho da atitude de evitar. A pesquisa mostra que as principais tarefas adiadas são limpar a casa, investir na carreira, cuidar da saúde e planejar as finanças.

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No fim do dia – ou do mês! – muita gente consegue cumprir as tarefas a tempo, mas cerca de 20% são procrastinadores crônicos em casa e no trabalho. Para eles, um grande fator é o medo de fracassar, de não atender às expectativas. Kelli Saginak, do estado americano de Wisconsin, orientadora de saúde funcional de 57 anos, procrastinou durante anos a busca de um novo emprego. A incapacidade de agir simplesmente confirmou sua crença de que nunca faria nada melhor. “É puro medo de julgamentos”, confessa ela. “Se não correr riscos, não decidir nem me comprometer, não terei de enfrentar julgamentos. Mas sou eu simplesmente me julgando.”

Algumas pessoas adotam o hábito de procrastinar porque acreditam que agem melhor sob pressão. Mas os pesquisadores refutaram essa ideia. “Fiz uma experiência vários anos atrás e mantive os procrastinadores sob restrições de tempo”, diz Joseph Ferrari, professor de Psicologia da Universidade DePaul, em Chicago. “Eles tiveram desempenho pior do que os não procrastinadores, mas acharam seu resultado melhor. Cometeram mais erros e levaram mais tempo.”

Seja qual for a motivação (ou a falta dela), em geral a procrastinação não vai lhe fazer bem. Adiar a dieta ou o programa de exercícios pode aumentar o risco de doença cardíaca. Não consultar logo o médico, quando a doença é mais fácil de tratar, pode encurtar a vida. Basta pensar no que você não fez para sentir desconforto.

“Os procrastinadores sofrem nível elevado de estresse, tanto por deixar as coisas para a última hora quanto pelos sentimentos negativos e autocríticos sobre a procrastinação”, adverte Fuschia Sirois, professora de Psicologia da Universidade de Sheffield, na Inglaterra. “Algumas pesquisas mostraram que esse estresse aumenta a vulnerabilidade a resfriados, problemas digestivos, insônia, enxaqueca e tensão muscular.”

Uma das atividades mais procrastinadas: ir dormir. As desculpas são sempre as mesmas: “mereço relaxar” ou “quero salvar o dia fazendo algumas coisas que ainda não terminei”. Mas a procrastinação na hora de dormir pode causar privação de sono, que, por sua vez, provoca obesidade, doença cardíaca e muitos outros problemas de saúde.

Eis uma boa notícia: as pessoas tendem a procrastinar menos com a idade. “Quando envelhecemos, a ilusão de imortalidade nos é arrancada”, diz Steel. “Fica mais claro: quantos verões nos restam? Dez? Quinze? Eles são mesmo finitos. O que vamos fazer com cada um desses verões?”

Para quem precisa de motivação, o melhor conselho talvez seja pensar pequeno.

“Costumávamos acreditar que os comportamentos seguem a atitude, mas é possível dar a partida com um pouquinho de progresso que nos motive”, sugere Pychyl. Portanto, se está procrastinando o início da rotina de exercícios, basta calçar os tênis de caminhada. Se vem adiando um projeto no trabalho, releia as anotações de seu chefe sobre ele.

Em seguida, tente mandar a si mesmo mensagens que provoquem a ação. Por exemplo, você pode usar um interruptor automático com variação de luminosidade e regulá-lo para baixar as luzes na hora de se deitar. Joel Anderson, professor-pesquisador de Filosofia na Universidade de Utrecht, nos Países Baixos, criou um experimento com esse conceito, que deu certo com a maior parte dos participantes. “Eles formaram uma intenção”, diz Anderson. “‘Quando as luzes começam a baixar, começo a ir me deitar.”’

Finalmente, recompense-se a cada passo dado rumo à meta. Depois da academia, tome um banho relaxante. Depois de pagar as contas, assista a seu programa favorito na TV. (Mas não tente se convencer de que o  contrário vai funcionar!)

POR LISA FIELDS