Fertilidade vulcânica: veja como a lava modifica o solo

Os solos vulcânicos são ricos em nutrientes essenciais aos vegetais, como potássio e fósforo, e vários elementos residuais importantes.

Douglas Ferreira | 9 de Novembro de 2021 às 18:29

Gabriel Trujillo/iStock -

As ilhas indonésias de Java e Bali sustentam algumas das populações rurais mais densas do mundo, com média de 800 pessoas por quilômetros quadrado. Um dos segredos por trás dessa florescente presença humana é a fertilidade das ilhas.

Os solos vulcânicos são ricos em nutrientes essenciais aos vegetais, como potássio e fósforo, e vários elementos residuais importantes – elementos químicos necessários em quantidades mínimas para que as plantas se desenvolvam de maneira adequada. Frutas, hortaliças e muitas outras plantações se desenvolvem em cada trecho de terra cultivável. Bali, em particular, é famosa pelos terraços de arroz, esculpidos como obras de arte nas encostas vulcânicas da ilha. 

Nutrientes vindos de baixo

Apesar de as explosões vulcânicas causarem desastres de curta duração, a longo prazo produzem amplos benefícios. As erupções de lava, as quedas de cinzas vulcânicas e os fluxos piroclásticos (torrentes de gases quentes, cinzas e fragmentos de rocha) causam destruição nas áreas próximas, soterrando ou incinerando matando animais que pastam. Mas durante milhares de anos, os depósitos que deixam para trás costumam se transformar em algumas das terras mais ricas, mais férteis e mais naturalmente vibrantes do planeta.

O ciclo começa com um processo chamado intemperismo, que decompõe os depósitos vulcânicos e libera elementos químicos e nutrientes neles contidos. Esses, em seguida, tornam-se acessíveis a plantas e outros organismos vivos.

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Por causa das origens no fundo da crosta terrestre, as rochas vulcânicas são ricas em elementos, como cobre e zinco, que são escassos em outras partes, mas necessários às plantas em quantidades residuais. À medida que o intemperismo continua, os depósitos se decompõem em solo – fragmentos minerais misturados com um pouco de material orgânico e grandes quantidades de microrganismos.

Os solos formados pela decomposição de cinzas vulcânicas, chamados andosol, são formados sobretudo por grãos de vidro vulcânico com minerais não cristalinos, como a imogolita, substância incomum cuja estrutura consiste em vários feixes de pequenos tubos.

O andosol costuma ter alta capacidade de transportar água, e esse é um dos motivos pelos quais é tão bom para o crescimento das plantas. Os solos maduros dominados pelo andosol também tendem a ser resistentes à erosão e à compactação, o que traz mais benefício à agricultura. Eles podem ter baixo teor de matéria orgânica, por isso em locais como Java e Bali, a tradicional rotação das lavouras, combinada com o uso de adubo orgânico composto e adubo animal, é necessária para aproveitar ao máximo a riqueza potencial da terra.

Ilhas de fertilidade

O sul da Itália oferece um admirável exemplo do efeito de um vulcão sobre a terra agrícola. Em geral, a agricultura é difícil nessa parte da Itália – o calcário forma a rocha de embasamento e o solo é pobre. Mas a região em torno da baía de Nápoles, dominada pelo monte Vesúvio, é extremamente fértil, sobretudo por causa de duas grandes erupções do vulcão cerca de 35 mil e 12 mil anos atrás.

Elas cobriram a região com espessos depósitos de tefra (cinzas e outros produtos ejetados no ar por um vulcão), que desde então as intempéries transformaram em alguns dos solos mais ricos na Europa, com uma abundância de minerais e nutrientes do fundo da Terra. Videiras, hortaliças e flores crescem em cada metro quadrado. A área é famosa por seus tomates-cereja e seus vinhos Lacryma Christi, feitos das uvas Piedirosso e Coda di Volpe. O Vesúvio ainda está ativo – a última erupção foi em 1944 –, porém, longe de evitá-lo, mais de 2 milhões de pessoas vivem próximo a ele, beneficiando-se de sua generosidade vulcânica. 

A Ilha Norte da Nova Zelândia é outro lugar fértil graças às erupções vulcânicas. Elas aconteceram entre 4 mil e 40 mil anos atrás e criaram a base para as terras agrícolas das regiões de Waikato e da baía de Plenty. As cinzas vulcânicas decompostas são bem drenadas, mas contêm uma grande quantidade de água para as plantas e são facilmente cultivadas. Combinadas com chuvas abundantes, invernos brandos e verões quentes, elas produzem fartas safras de kiwis, maçãs e abacates. As profundas margas vulcânicas também são boas para o crescimento de pastagens, cruciais para a grande indústria de laticínios da Nova Zelândia. 

Animais e plantas podem se beneficiar de depósitos de cinzas vulcânicas, em particular para a incubação de ovos. Na ilha de Fernandina, nas Galápagos, iguanas terrestres foram observados fazendo o percurso até o vulcão La Cumbre para nidificar e enterrar seus ovos nos macios depósitos de cinzas no cume da cratera. O solo vulcânico morno ajuda no processo de incubação e é perfeito para proteger os ovos contra predadores. No outro lado do Pacífico, em Tonga, o Megapodius pritchardii, ou pássaro malau, põe ovos em cinzas vulcânicas por motivos semelhantes.