Superando as próprias barreiras

Você imagina como seria viver em meios as trevas da cegueira? Tracy Carcione não se deixou abalar e superou suas barreiras. Confira essa história!

Julia Monsores | 6 de Janeiro de 2020 às 17:00

Ljupco/iStock -

Li certa vez, numa revista americana, uma história que me deixou impressionada. Era sobre uma jovem, Tracy Carcione, que fizera uma demonstração no Museu de Arte Moderna de Nova York. Críticos tinham sido chamados para ver a artista autodidata desenhar. Quem chegasse, dizia a matéria, e visse a apresentação – Tracy sentada diante de seus observadores, munida de uma caneta esferográfica, desenhando formas geométricas – na certa não acharia nada de mais.

Isso até saber de um detalhe: Tracy era cega desde a infância. E, embora não pudesse ver aqueles objetos de madeira que tinha à frente – cones, cubos e esferas –, era capaz de desenhá-los com um senso de perspectiva tão perfeito que chamava a atenção.

Superando as próprias deficiências

Segundo a revista, o caso de Tracy não é único e mesmo os cegos de nascença às vezes são capazes de copiar objetos com uma perfeição admirável. A explicação seria a de que o desenho é uma habilidade cognitiva tão profundamente embutida no cérebro que pode se manifestar mesmo entre aqueles que nunca enxergaram.

Assim que acabei de folhear a revista, e ainda refletindo sobre a capacidade que o ser humano tem de superar as próprias deficiências (o mesmo ser humano capaz de cometer tantas atrocidades), saí para dar uma caminhada na orla. 

Era, como tantas têm sido, uma linda manhã de sol, de um verão que não queria mais acabar. Mas o calor naquele dia não estava excessivo, e uma aragem movia as palmeiras, começando a levantar a crista das ondas. Eu ia distraída, olhando o mar, quando de repente vi, alguns metros à frente, vindo em minha direção, um casal de deficientes visuais. Eram jovens, ainda. Caminhavam juntos, apoiados um no outro e em suas bengalas especiais.

Mas havia nesse andar uma desenvoltura inesperada, como se estivessem certos de que, juntos, nenhum objeto lhes barraria o caminho. Como se nada tivessem a temer. Isso me fez parar. E também a lembrança imediata da história sobre a moça cega que desenhava. 

“Naquele instante, existiram apenas eles dois, mais nada, imersos em seu mundo de escuridão e silêncio.”

Enquanto pensava no que será viver num mundo de trevas, esperei, junto à calçada, que os dois passassem por mim. Mas ocorre que eles pararam também. Pararam – e se olharam. Depois, envolveram-se nos braços um do outro – e se beijaram. Não foi espetaculoso, foi apenas um beijo leve, nos lábios, mas carregado de tamanha ternura que tudo à volta deles pareceu congelar de repente, ou deixar de existir. Ou foi ainda como se existisse dentro de uma dimensão encantada. 

Por um instante em suspensão, tempo e espaço desapareceram, restando apenas aquele beijo tátil, alimentado pela matéria escura em que ambos estavam mergulhados. Todos em volta pareceram compreender. E – não foi impressão, tenho certeza – fez-se um silêncio durante o tempo assombrado que durou o beijo. Naquele instante, existiram apenas eles dois, mais nada, imersos em seu mundo de escuridão e silêncio. 

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