Verdades e mitos sobre o envelhecimento

Se você acredita que envelhecer é sinônimo de fragilidade e doenças, você está enganado. Veja os mitos sobre envelhecimento.

Douglas Ferreira | 24 de Novembro de 2021 às 17:00

Diamond Dogs/iStock -

Se você acredita que envelhecer é sinônimo de fragilidade, demência e enfermidades, você está muito enganado. É verdade que com o passar dos anos a nossa saúde física e mental é afetada, mas isso não quer dizer que o envelhecimento é sinônimo de vida ruim e debilitada.

“Esqueça tudo o que você achava que sabia sobre envelhecimento e memória”, diz a Dra. Sonia J. Lupien, que dirige o Centro para Estudos sobre Estresse Humano na Universidade McGill, no Canadá. “Acreditamos que os mais velhos têm memória pior e menos capacidade de aprender porque baseamos essas opiniões em estudos deficientes. Deve-se considerar como os estudos são conduzidos”, diz ela.

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As pessoas têm de ir a um ambiente universitário, em geral à tarde, onde são testadas por um jovem. Os “jovens” participantes são, em sua maioria, universitários que sabem se locomover no campus, sentem-se à vontade sendo testados por alguém da mesma faixa etária e preferem ser testados no fim do dia, pois dormem até tarde.

Analise isso sob a perspectiva de um dos participantes mais velhos. Você tem de ir de carro até a universidade e encontrar um local para estacionar, ou usar transporte público e então vagar pelo campus até achar a sala certa. Você se depara com alguém jovem o suficiente para ser seu neto que faz perguntas pessoais e o submete a testes. Você provavelmente está acordado desde as seis da manhã, e as tardes podem não ser seu melhor horário do dia. Você prefere tirar um cochilo às 14h a fazer um teste (estudos indicam que a memória das pessoas mais velhas pela manhã é melhor do que a das mais jovens à tarde).

O fator estresse como fator determinante

“Se você é mais velho essa experiência é estressante”, diz a Dra. Lupien. “É ruim por duas razões: primeira, quanto mais velho se é, mais o corpo reage ao estresse; e, segunda, como mostram as pesquisas, quanto mais agudo é o estresse, pior fica a memória”.

Aí vem o teste. Se pessoas mais velhas receberem palavras para serem memorizadas e dissermos que sua memória está sendo avaliada, o resultado será ruim. Mas, se dermos as mesmas palavras para serem memorizadas e dissermos que a capacidade de aprendizado de idosos está sendo avaliada, elas terão desempenho melhor. Por quê? Todos estão condicionados a acreditar que a memória piora com a idade. E, se você acredita que algo é de um jeito, assim será. 

(Imagem: Highwaystarz-Photography/iStock)

Eis o ponto importante: quando analisam com mais atenção as pessoas que fazem os testes, os pesquisadores descobrem que os que têm boa saúde física, boa escolaridade, estão empregados e têm boa renda possuem capacidade de memorização tão boa quanto a de pessoas 30 anos mais jovens.

“Não venha me falar de deficiências de memória relacionadas à idade sem levar em conta o estresse”, diz a Dra. Lupien. Na verdade, ela está fazendo justamente isso. Em um grande estudo patrocinado pelos Institutos Canadenses de Pesquisa em Saúde, seu assistente de pesquisa de 70 anos faz as perguntas e conduz os testes de memória pela manhã em uma locação fora do campus que as pessoas mais velhas (mas não os participantes mais jovens) já visitaram em um grupo pré-pesquisa. “Os mais jovens odeiam”, afirma a Dra. Lupien com um sorriso.

Verdades e mitos sobre o envelhecimento

Que outros mitos sobre os efeitos físicos e mentais do envelhecimento existem? Aqui estão alguns.

Articulações doloridas fazem parte do envelhecimento

De jeito nenhum! Articulações que estalam e doem são um legado da falta de exercício. Pesquisadores da Universidade de Kuopio, na Finlândia, estudaram 55 homens e 226 mulheres com idades entre 55 e 75 anos que se submeteriam a cirurgias de joelho por causa da osteoartrite. Eles calcularam a quantidade de exercício físico que os participantes fizeram durante toda a vida e compararam com 524 pessoas selecionadas aleatoriamente. Após levar em conta idade, peso, estresse por trabalho físico e contusões de joelho do passado, os pesquisadores descobriram que quanto mais horas de exercício acumuladas, menor o risco de osteoartrite de joelho grave, que exige cirurgia.

Ossos frágeis e postura curvada são inevitáveis

Embora a osteoporose seja uma doença predominante em pessoas mais velhas, ela é também totalmente evitável. Um estudo com 424 mulheres centenárias descobriu que apenas 56% tinham osteoporose, e a idade média no momento do diagnóstico era de 87 anos. Nada mal, se considerarmos que essas mulheres cresceram bem antes de conhecermos os benefícios da alimentação saudável e dos exercícios.

Seus genes são os fatores mais determinantes de como você envelhece

Se esse fosse o caso, gêmeos idênticos envelheceriam da mesma forma, o que não acontece. Um grande estudo conduzido por pesquisadores americanos e europeus avaliou os hábitos de vida e a história clínica de 40 pares de gêmeos idênticos com idades entre 3 e 74 anos. Enquanto os gêmeos envelheciam, os pesquisadores descobriram que não apenas suas condições de saúde tomaram caminhos diferentes como seu genoma mudou de idêntico para um que mostrava várias diferenças. Geneticamente, o par de gêmeos mais velhos era o menos parecido. Como isso é possível? Tudo recai sobre o argumento “inato versus adquirido”. Você pode nascer com os genes mais saudáveis que a natureza pode oferecer, mas a maneira como você vive sua vida (a parte adquirida) determinará como esses genes se comportarão nos próximos 90 anos. No fim das contas, o que você come, o quanto de atividade faz e sua exposição a substâncias químicas podem alterar seus genes por meio da metilação – processo essencial na manutenção da função celular (mudanças nos padrões de metilação contribuem para o desenvolvimento do câncer).

Você perde potencial criativo

Não diga isso ao Dr. Gene Cohen, que dirige o Centro de Envelhecimento, Saúde e Humanidades na Universidade George Washington, em Maryland. O Dr. Cohen, que tem mais de 60 anos, começou uma segunda carreira como criador de jogos alguns anos atrás. Tamanha criatividade traz incríveis benefícios para pessoas mais velhas, ele descobriu. Na última década, ele e seus colegas vêm estudando o impacto da participação em arte e música de adultos mais velhos. Em um estudo envolvendo 168 idosos saudáveis, aqueles que entraram para um coral tinham saúde melhor, usavam menos medicação, eram menos solitários e sofreram menos quedas após um ano.

E, de acordo com uma pesquisa, a participação em artes aumenta a autoconfiança e as pessoas se sentem valorizadas e integradas. Outro estudo com 10 mil pessoas na Suécia revelou que as que frequentavam eventos culturais viviam 13 anos mais.

A sexualidade diminui

(Imagem: monkeybusinessimages/iStock)

Não é bem assim, diz Terrie B. Ginsberg, osteopata do Instituto de Envelhecimento Bem-sucedido de Nova Jersey. Em uma grande pesquisa sobre sexualidade e envelhecimento, ela percebe que, “ao contrário de muitas das nossas visões culturais e sociais do indivíduo que envelhece, nossa população mais idosa continua a aproveitar sua sexualidade”. O segredo é manter-se em forma. Impotência e libido diminuída não estão relacionadas com a idade, mas com condições clínicas que podem, em muitos casos, ser evitadas, tais como pressão arterial alta, doenças do coração, diabetes e depressão. Algo tão simples como fazer musculação duas vezes por semana pode melhorar sua vida sexual.

A sexualidade de indivíduos mais velhos tem recebido atenção limitada dos pesquisadores. Mas, de acordo com pesquisas com mais de 1.500 voluntários publicadas no British Medical Journal, pessoas mais velhas estão cada vez mais relatando ter uma vida sexual ativa e satisfatória. Nos últimos 30 anos, pesquisadores da Universidade de Gotemburgo, na Suécia, entrevistaram grupos de pessoas de 70 anos sobre sua vida sexual. Entre a primeira amostra, em 1971, e a última, em 2000, a proporção dos participantes que afirmavam manter relações sexuais aumentou em todos os grupos pesquisados: homens casados, de 52% para 68%, mulheres casadas, de 38% para 56%, homens solteiros, de 30% para 54%, e mulheres solteiras, de 0,8% para 12%. 

Pessoas que chegaram aos 70 anos nas amostras posteriores relataram maior satisfação com sua vida sexual e menos disfunções sexuais, e o número de mulheres que diziam ter orgasmos aumentou. Está claro que “a maioria das pessoas mais velhas considera a atividade sexual e as sensações associadas a ela uma parte natural da vida madura”.

Para os que estão reingressando no cenário amoroso, uma advertência: uma pesquisa com quase 8 mil pessoas com 50 anos ou mais realizada para a Saga Magazine descobriu que a maioria estava sexualmente ativa, mas corria risco de contaminação por doenças sexualmente transmissíveis por não usar preservativo com os novos parceiros. E, de acordo com informação da Agência de Proteção à Saúde, doenças sexualmente transmissíveis estão sendo disseminadas mais rapidamente entre pessoas com mais de 45 anos, provavelmente porque elas não tenham de evitar a gravidez e estejam menos conscientes da necessidade de proteção contra o comportamento sexual de risco.

Seu cérebro para de se desenvolver após os 3 anos

Quando esse mito de desenvolvimento passou a ser desconsiderado na década de 1990, a maneira como os cientistas encaravam o envelhecimento mudou. Eles não podiam mais olhar para o cérebro de pessoas mais velhas como algo estático. Em vez disso, estudos mostram que o cérebro continua a enviar novas conexões e a reforçar as que já existem por toda a vida – com a condição de que você continue a estimulá-lo. Ele é o “músculo” mais importante do corpo.

O cérebro encolhe com a idade

Esse mito teve início com estudos em 2002. Eles mostravam que a parte do cérebro que controla a memória, o hipocampo, era bem menor em pessoas mais velhas. Ainda assim, pesquisas inovadoras conduzidas pela Dra. Lupien na década de 1990 revelaram que o estresse crônico encolhe o hipocampo. Era a idade ou o estresse o responsável pelo encolhimento do cérebro nas pessoas com mais idade?

Provavelmente o estresse. Quando examinou imagens cerebrais de 177 pessoas entre 18 e 85 anos, a médica descobriu que 25% dos indivíduos entre 18 e 24 anos tinham volumes de hipocampo tão pequenos quanto os de adultos com idades entre 60 e 75 anos. Seu argumento é de que talvez “os hipocampos menores nas pessoas de idade já fossem assim quando elas eram mais jovens, possivelmente como resultado de estresse”. Outra pesquisa conduzida por ela mostrou que pessoas nascidas durante as guerras mundiais têm hipocampos menores; a razão provável é que os nascidos durante as guerras eram expostos a situações estressantes muito cedo.

As pessoas mais velhas são rabugentas e infelizes

Não exatamente. Quando pesquisadores de Heidelberg, na Alemanha, entrevistaram 40 centenários, descobriram que, apesar dos significativos problemas físicos e mentais, 71% disseram que eram felizes e mais da metade afirmou ser tão feliz quanto na juventude. Comparando-os com um grupo de pessoas de meia-idade, os pesquisadores descobriram que os grupos eram igualmente felizes. O mais importante: quase 70% dos centenários afirmaram rir com frequência. O que tudo isso significa? Que não existe uma definição universal para o envelhecimento. A maneira como você envelhecerá depende inteiramente de você – a começar por hoje.