Mistério médico: Rara e fatal

Alguns casos intrigam até mesmo os médicos mais experientes. O caso médico abaixo certamente está nessa lista de mistérios médicos que intrigam os

Redação | 1 de Maio de 2020 às 01:01

pcess609/iStock -

Alguns casos intrigam até mesmo os médicos mais experientes. O caso médico abaixo certamente está nessa lista de mistérios médicos que intrigam os especialistas.

PACIENTE: Megan (nome alterado para proteger a privacidade), nutricionista de 25 anos
SINTOMAS: Pressão alta, convulsões e confusão mental
MÉDICO: Dr. Umar Farooq, nefrologista do Centro Médico Milton S. Hershey, da Faculdade de Saúde da Universidade do Estado da Pensilvânia, em Hershey, Pensilvânia

Correu tudo bem na primeira gestação de Megan. Ela não teve enjoo matinal, só inchaço nas pernas e nos pés. Assim, em dezembro de 2016, quando visitou o obstetra para o exame de 38 semanas, não esperava surpresas. Mas foi mandada para o hospital. “Minha pressão estava tão alta que me disseram: ‘Vamos tirar esse bebê de dentro de você’”, recorda Megan. Ela estava com sintomas de pré-eclâmpsia, uma complicação perigosa da gestação que pode pôr a mãe e o bebê em perigo.

Normalmente, a pré-eclâmpsia se resolve depois do parto. Como estava sentado, o bebê nasceu por cesariana, mas a pressão arterial de Megan continuou alta. Após quatro dias no hospital, ela foi mandada para casa com uma combinação de medicamentos que parecia controlar o problema.

Quinze dias depois do parto, Megan pôs o filho para dormir e começou a preparar a comida das festas de fim de ano. Embora não se lembre, ela foi parar no quarto, onde o marido a encontrou tendo uma convulsão. Apavorado, ele chamou o serviço de emergência. A caminho do hospital,
ela teve uma segunda convulsão.

Um caso difícil para os médicos

Embora os médicos conseguissem interromper as convulsões com medicamentos, a pressão arterial de Megan disparou. Uma tomografia do cérebro mostrou mudanças que podem ser causadas por hipertensão extrema. Enquanto isso, os pensamentos de Megan estavam confusos: ela reagia a ordens, mas devagar, e a visão estava borrada e obscura.

Megan foi imediatamente transferida para o Centro Médico Milton S. Hershey, da Faculdade de Saúde da Universidade do Estado da Pensilvânia, a meia hora de distância e mais equipado para tratar de doenças complexas. O marido e os sogros ficaram ansiosos e preocupadíssimos enquanto os médicos faziam exames para descobrir o que havia por trás daquela pressão alta. Com cinco dias no hospital, a função renal de Megan começou a falhar. “Ninguém sabia o que estava acontecendo”, diz ela.

“Era uma combinação de coisas bastante ruim”, diz o Dr. Umar Farooq, nefrologista da equipe que cuidou de Megan. A biópsia do rim mostrou inflamação e coágulos sanguíneos nos minúsculos vasos do órgão. É a chamada síndrome hemolítico-urêmica (SHU), com várias causas possíveis, cada uma com tratamento diferente.

A tentativa de diagnóstico

Na maioria das vezes, a SHU é causada por uma infecção por E.coli, mas Megan não tinha sinais da bactéria. Outro diagnóstico que parecia provável para os médicos era o lúpus, porque o exame de Megan apresentara anticorpos encontrados nessa doença autoimune. “Eu quase torcia para que fosse lúpus”, diz ela. Pelo menos, era algo de que ouvira falar e que sabia que conseguiria controlar.

De 5% a 10% das pessoas sem lúpus também têm esses anticorpos. Ainda assim, os médicos de Megan começaram o tratamento: ministraram esteroides e fizeram uma plasmaférese, procedimento que remove o plasma sanguíneo do paciente e o substitui por plasma saudável.

Ela não melhorou, segundo Farooq: “Os rins, em vez de melhorar, pioraram, a ponto de termos de fazer diálise.”

A busca por um novo diagnóstico

Com a saúde de Megan piorando, Farooq se convenceu de que deveriam voltar sua atenção para outra doença da lista de possíveis causas. Em casos raríssimos, os pacientes apresentam a predisposição genética de desenvolver SHU, que surge sob estresse. “No caso de Megan, o estresse sobre o organismo teria sido a gravidez”, diz Farooq. A doença é tratável com um medicamento imunoterápico chamado eculizumabe, administrado por infusão intravenosa. Mas o preço é altíssimo, o que fez a equipe repensar, pois seria difícil o seguro-saúde cobrir a despesa sem mais indícios.

“Mas tínhamos feito o tratamento de lúpus, e ela não reagira”, diz Farooq. “Se você vai para a direita e vê que é o caminho errado, então é preciso ir para a esquerda.” Eles tinham de saber urgentemente se Megan tinha mesmo essa mutação genética. “A chance de morte é altíssima nesses casos, porque a doença pode afetar outros órgãos além do rim.”

Antes de obter um medicamento tão caro, era necessário fazer um exame genético, que levou dez dias, uma espera tediosa para Megan. “Minha família e eu estávamos cansados e muito enjoados de ficar no hospital”, diz ela.

Embora o bebê fosse bem cuidado por membros da família e ela o visse quase diariamente, a separação era dolorosa. “Tive medo de não desenvolver os laços necessários para um recém-nascido”, diz ela. Quando o resultado finalmente chegou e mostrou que Megan tinha mesmo a mutação,
ela recebeu na mesma hora a primeira dose de eculizumabe.

A vida após a descoberta da mutação

Com o diagnóstico e o tratamento corretos, a pressão arterial de Megan se normalizou e ela finalmente pôde voltar para casa. Sua visão melhorou alguns meses depois. Por causa da extensão dos danos renais, ela precisou
de diálise durante quatro meses, mas os rins também acabaram se recuperando.

Hoje, Megan se ocupa com o trabalho e a família. Ela conseguiu ir distanciando e, afinal, suspender as infusões de eculizumabe, mas, como sua mutação genética é muito rara, pouco se sabe sobre recaídas. Ela fica atenta a qualquer sintoma de que a doença esteja voltando e desenvolveu técnicas para controlar o estresse, já que ele é um gatilho. “Comecei a me exercitar mais”, diz ela. “Também tento relaxar a mente, não ficar tão ansiosa e seguir o fluxo.”

Por Lisa Bendall