Alimentos ultraprocessados favorecem o envelhecimento celular

Estudo feito pela Universidade de Navarra aponta que alimentos ultraprocessados estão ligados ao envelhecimento das células. Entenda!

Thaynara Firmiano | 16 de Setembro de 2020 às 15:00

Gopixa/iStock -

Alimentos ultraprocessados, como salgadinhos de pacote, pratos prontos congelados, refrigerantes e biscoitos industrializados, estão ligados ao envelhecimento das células. A informação é de um estudo feito pela Universidade de Navarra, na Espanha.

O estudo analisou as dietas de 886 idosos, com idade média de 67,7 anos, e o comprimento dos telômeros, que são as “pontas” dos cromossomos – as estruturas responsáveis por armazenar o DNA dentro do núcleo das células. Normalmente as células humanas têm 23 pares de cromossomos, cada um com dezenas, centenas ou até milhares de genes.

Leia também: “A cura vem das relações”, diz Alanis Morissette sobre depressão pós-parto

Os telômeros funcionam como uma espécie de capa protetora. Eles não armazenam informação genética de fato, mas conservam a integridade do restante do DNA. Seu tamanho indica qual é a capacidade de a célula se replicar. Isso porque a cada vez que a ela se divide (no chamado ciclo celular), uma parte do telômero é perdida.

Imagem: Eamanver/iStock

Assim, a alteração dos telômeros tem potencial para afetar uma enormidade de processos biológicos.

“Quando a célula atinge um certo limite de replicações, ela entra em senescência e pode morrer. Nesse estágio, ela produz citocinas (classe de moléculas) inflamatórias, o que acelera o envelhecimento dos tecidos do corpo”, explica Marcelo Mori, pesquisador e professor da Unicamp, que não participou do estudo.

Outros fatores influenciam

Outros fatores, além do passar do tempo, podem interferir no comprimento de telômeros. Dentre eles estão o contato com toxinas e obesidade (capazes de encurtá-los) ou câncer, que os prolonga, tornando a célula tumoral capaz de se replicar indefinidamente.

No trabalho, os cientistas mediram o tamanho dos telômeros a partir de DNA de uma amostra de saliva.  Com essa medição, foi constatado que, conforme o consumo reportado de ultraprocessados era maior, mais frequente eram os casos de telômeros curtos.

Leia também: Queda na vacinação pode ser mais grave que a Covid-19 para crianças, diz epidemiologista

Imagem: Ravsky/iStock

Foram descontados na análise estatística o possível efeito de fatores como idade e sexo, colesterol alto e tabagismo. Participantes que consumiam três ou mais porções de ultraprocessados ao dia tinham risco, em média, 82% maior de ter telômeros considerados curtos em relação a quem tinha consumo baixo, de menos de duas porções diárias.

“Acreditamos que a associação observada entre o consumo de alimentos ultraprocessados e o risco de ter telômeros curtos pode ser explicada por maior ingestão de sal, gordura saturada e açúcar, bem como ingestão inadequadas de fibras e micronutrientes. Os participantes que consumiram uma quantidade maior desses alimentos em nossa coorte tiveram maior ingestão de […] carnes processadas e menor ingestão de fibras, potássio, fósforo, magnésio, cálcio, frutas e vegetais; e uma menor adesão ao padrão alimentar mediterrâneo”, escrevem os autores no estudo.

Sobre a pesquisa

A pesquisa foi publicada no periódico American Journal of Clinical Nutrition e apresentada no Congresso Europeu e Internacional de Obesidade.

“O trabalho avaliou um grupo de idosos, por isso não podemos dizer que o mesmo acontece em outras faixas etárias. Outros estudos também já mostraram que existe uma diferente taxa de perda de comprimento telomérico ao longo da vida, sendo que ela se acentua na velhice”, diz a pesquisadora da Unifesp Vanessa Ota, que não se envolveu na pesquisa.

(Carotur/iStock)

Leia também:8 tipos de transtornos alimentares que podem prejudicar a sua saúde

Outra limitação, lembra Ota, é que as análises foram feitas a partir de saliva, que possui muitos tipos celulares diferentes, o que pode deixá-las menos precisas.

Várias pesquisas em todo o mundo têm tentado demonstrar o impacto na saúde de alimentos ultraprocessados. Esses alimentos frequentemente contêm saborizantes, corantes, emulsificante e aditivos cosméticos.

Os processos industriais deixam esses alimentos prontos para consumo e com longa vida de prateleira. No entanto, esses itens também estão relacionados a uma dieta pobre e não balanceada, sendo frequente consumidos em excesso.

Recentemente um trabalho brasileiro, do Elsa (Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto), mostrou que pessoas que ingerem esses alimentos tendem a ser mais obesos. Em 2019, um estudo intervencional (algo mais raro nessa área) mostrou a relação causal entre consumo de alimentos ultraprocessados e ganho de peso.

O trabalho da Universidade de Navarra, por ser um estudo de correlação, não permite concluir que existe uma relação de causalidade entre dieta e telômeros curtos, afirma Mori.

“Há indícios do impacto de alimentos ultraprocessados na saúde e o encurtamento de telômeros é um marcador importante, mas outros precisariam ser avaliados para saber se essas pessoas realmente têm um envelhecimento acelerado.”

GABRIEL ALVES||FOLHAPRESS