Nova regra do cheque especial limita juros mas permite cobrança de taxa

Novas regras do cheque especial não resolvem problema de juros altos e ainda autorizam cobrança de tarifa que não existia.

Samasse Leal | 6 de Janeiro de 2020 às 16:00

selensergen/iStock -

A nova regulamentação do Banco Central do Brasil-Bacen, fixou a taxa de juros do cheque especial em 8% ao mês. Isso significa que em um ano o cliente que usar o cheque especial pagará uma taxa de juros de 151,8% ao ano. Essa regra começa a valer hoje.

Apesar da mudança, taxa de juros continua muito alta

Por um lado, a nova regra traz um benefício aos clientes de bancos em todo o país, principalmente aos endividados. Isso porque, antes desta regulamentação, as taxas praticadas pelos bancos chegavam a um média de 305,9% ao ano. Ou 12% ao mês. Não havia limite para a cobrança. Acreditava-se que a livre concorrência entre os bancos faria com que essas taxas fossem fixadas pela procura de clientes.

Porém, essa concorrência não é tão livre assim. A grande maioria das pessoas mantém contas bancárias nos bancos onde recebem seus salários e não por sua livre escolha. O mercado bancário é praticamente concentrado entre apenas 04 grandes bancos. Nem mesmo a possibilidade de portabilidade do salário foi eficiente o suficiente para tornar esta concorrência verdadeiramente real. Além disso, nem as altíssimas taxas praticadas limitaram a utilização do limite de crédito do cheque especial pelas pessoas.

Mas o benefício dessa redução da taxa de juros, fixada em 8% ao mês, não é tão bom assim. Embora os juros anuais tenham caído quase pela metade (de 305,9% para 151,8%), ainda continuam muito altos. Principalmente num cenário em que a taxa básica de juros SELIC está fixada, pelo mesmo Bacen, em 4,5% ao ano.

O crédito do cheque especial continua sendo um mal negócio

Veja bem a relação: se você ficar devendo ao banco por um ano, vai pagar 151,8% de juros. Ou seja, mais do que o triplo do valor que usou. Se emprestar seu dinheiro ao banco, contratando um CDB, que pague 100% do CDI, receberá menos de 4,5% no ano.

Vale saber que a maioria dos grandes bancos oferecem CDB com remuneração de 70% a 90% do CDI. Ou seja, nem chega a 4,5% ao ano. O CDI é uma taxa que acompanha a SELIC, fica sempre um pouquinho abaixo.

Demais formas de crédito ao consumidor, como crédito pessoal e empréstimo consignado, possuem taxas de juros bem mais baixas. Vale mais a pena fazer um empréstimo no banco do que entrar no cheque especial. E vale mais a pena contratar um CDB de um banco de investimentos pequeno, acessando bancos digitais. Em alguns bancos de investimentos as taxas de remuneração do CDB chegam a até 120% do CDI.

Lembre-se que o CDB é investimento garantido pelo Fundo Garantidor de Crédito – FGC, até o limite de R$ 250 mil. Para escolher onde investir, você pode conhecer os dados sobre os bancos de investimentos acessando o site www.bancodata.com.br

Além disso, uma nova tarifa

E não é só isso. Além da taxa de juros continuar elevada, foi autorizada a cobrança de uma nova tarifa. Ela poderá ser cobrada simplesmente pela disponibilização do limite de crédito acima de R$ 500,00. Ela vai corresponder a 0,25% sobre o valor que ultrapassar R$ 500,00 de limite. Ou seja, somente por ter um limite de cheque especial acima de R$ 500,00 você vai pagar a tarifa. Mesmo que não use o crédito, mesmo que não entre no cheque especial nem por um centavo. Apenas por ter o limite disponível para você.

Na verdade, ela é uma forma de compensar a perda dos bancos pela redução da taxa dos juros. E quem paga é o cliente do banco, o consumidor.

A cobrança da tarifa será automática somente para novos contratos, ou seja, contas abertas a partir de hoje. Para quem já possui conta corrente, a cobrança da nova tarifa poderá ser feita a partir de 01 de junho. Será necessária uma repactuação, ou seja, o cliente terá de concordar.

Acreditamos que, na prática, os bancos irão reduzir o limite do cheque especial para R$ 500,00 (limite isento da cobrança). A partir de então, passarão a oferecer limites maiores, mediante a cobrança da taxa. Portanto, fique atento!

Quem quiser evitar o pagamento dessa tarifa, tem duas opções, que já pode adotar:

Recomendamos aos consumidores que já estejam utilizando o limite de credito consultem seus gerentes sobre a cobrança da tarifa. Quem já está no vermelho terá a tarifa descontada da cobrança dos juros. Ou seja, se os juros cobrados forem de R$10,00 e a tarifa de R$ 2,00, esse valor da tarifa não poderá ser acrescido ao débito. Vale a pena pedir que sobre o saldo devedor seja aplicada a nova taxa de 8% e não a taxa anteriormente cobrada. Negocie!

Banco do Brasil e Itaú decidiram não cobrar esta tarifa autorizada

Pelo menos nesse início da nova regulamentação é natural não haverem mudanças bruscas para os clientes. Com o passar do tempo, e menos destaque da mídia, é mais comum que elas comecem a ser efetuadas. Além disso, a isenção dessa cobrança é uma boa oportunidade para os bancos fazerem publicidades positivas isentando a cobrança.

Fale sempre com o seu gerente. Questione. Se informe. Somente um movimento efetivo dos clientes, em massa, poderá fazer com que o mercado se modifique. A chegada dos bancos digitais já começou a impactar os serviços oferecidos pelos bancos tradicionais de grande porte. Eles não cobram tarifas para contas correntes e cartões de crédito. Assim, há argumento para pedir o mesmo ao seu gerente no grande banco. E muitos deles já oferecem empréstimos com taxas de juros bem mais baixas do que as dos grandes bancos.

Portabilidade do cheque especial poder ser vantajosa

Outra novidade, prevista para ter início a partir de abril, é a portabilidade da dívida no cheque especial. Como isso vai funcionar? O cliente poderá levar sua dívida para outro banco negociando taxas e encargos menores. Poderá contratar um crédito pessoal ou empréstimo consignado em outro banco para substituir sua dívida no cheque especial. Atualmente isso acontece no próprio banco. Com essa opção também se espera que haja uma concorrência que derrube as taxas de juros.

Regulamentação contraria o CDC?

Para muitos especialistas em Direito do Consumidor, a nova regulamentação cria tarifa para um serviço que não é prestado. Se não há prestação de serviço, já que o crédito não é tomado, não deveria haver cobrança.

Na grande maioria dos casos, os próprios bancos determinam os limites de créditos que são disponibilizados. E aumentam esses limites, unilateralmente, ou seja, mesmo sem nenhum pedido do cliente.

A desculpa dos bancos é que possuem um custo para disponibilizarem o limite de crédito. Mas esse argumento não se sustenta. Justamente porque na maioria dos casos os limites sempre foram disponibilizados sem solicitação dos clientes e sem qualquer cobrança. E isso, mesmo sem a utilização pelo cliente. Se o banco realmente tivesse um custo, não garantiria o limite de crédito de graça.

O Diretor de Regulação do Bacen, comentou sobre a disparidade entre o valor disponibilizado pelos bancos e o utilizado. Dos R$ 350 bilhões disponibilizados atualmente para cheque especial, apenas cerca de R$ 26 bilhões são utilizados pelos clientes. Bastaria os bancos reduzirem sua oferta de crédito para reduziriam seus supostos custos, ao invés de quererem repassar aos clientes. Afinal, menos de 10% do que é disponibilizado é efetivamente utilizado.

Entre em contato com o seu gerente. Vamos seguir num movimento em favor de nossos direitos.