Generosidade em tempos de Covid-19

Jaime Coronel não é médico nem enfermeiro. Não salvou nenhuma vida nem inventou vacinas. É uma pessoa comum. Mas, a seu modo, como muita gente no mundo

Redação | 1 de Novembro de 2020 às 08:00

Seleções/Reader's Digest -

Jaime Coronel não é médico nem enfermeiro. Não salvou nenhuma vida nem inventou vacinas. É uma pessoa comum. Mas, a seu modo, como muita gente no mundo inteiro, ajudou a melhorar a vida dos outros na pandemia de Covid-19.

O altruísmo assume muitas formas, como este ano nos mostrou, mas brota principalmente do desejo simples de ajudar a melhorar a situação.

Indiretamente, as boas ações também dão significado à vida em tempos de crise e geram uma sensação maior de conexão com os outros, ainda mais quando estamos famintos de companhia.

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A história de Jaime é um dos muitos exemplos. Tudo começou com uma descoberta fortuita e terminou com o desejo de causar impacto positivo na vida das crianças.

Arquiteto de redes que administra a empresa de mudanças da família na cidade espanhola de Puertollano, Jaime foi arrumar o quarto de depósito da casa, nos primeiros dias da quarentena, e encontrou uma fantasia de Olaf, o boneco de neve meio pateta do desenho animado Frozen, de Walt Disney.

“Pensei: vamos fazer uma maluquice”, diz ele, rindo e recordando o dia. “Então, vesti a fantasia. Quando me viu, Mara, minha filha de 4 anos, pediu para vestir sua fantasia de Elsa, a princesa do filme. Passamos o dia todo vestidos de personagens de Frozen.”

Jaime Coronel e a filha, Mara, se fantasiaram para pôr o lixo para fora durante a quarentena, o que divertiu muito os vizinhos.

Na Espanha daquela época, todo dia, às oito da noite, as pessoas iam para as janelas e varandas bater palmas e dar vivas aos trabalhadores da saúde que arriscavam a vida na linha de frente da pandemia.

“Decidi que seria uma boa hora para pôr o lixo na rua ainda fantasiado de Olaf”, conta Jaime. Ao fazer isso, ele recebeu dos vizinhos uma ovação entusiasmada. E assim nasceu uma tradição.

Todo dia, pouco antes das oito da noite, Jaime levava o lixo para fora de casa com uma fantasia diferente. Num dia, era uma múmia egípcia, no seguinte, um dinossauro, Freddy Krueger de A hora do pesadelo, um robô ou um xeque árabe.

Ele já tinha um estoque de fantasias do carnaval e de festas de Halloween, e, quando se esgotaram, comprou outras pela internet; uma empresa de Aragão também lhe doou fantasias. Ele chegou a fazer algumas, auxiliado por Mara e pela avó de Mara, ex-costureira.

Toda vez, recebia aplausos arrebatados dos vizinhos e depois postava um vídeo nas mídias sociais. Jaime fez isso durante 29 dias e, quando as regras da quarentena afrouxaram e permitiram que crianças saíssem, Mara foi com ele na excursão diária. Os dois se fantasiaram juntos e fizeram mais nove viagens.

No último dia das saídas conjuntas, equipes locais de ambulância chegaram de surpresa para dar balas a Mara E agradecer a Jaime por alegrar os outros.

Até então, graças às suas postagens no Instagram, Jaime já era conhecido pelo mundo inteiro e ajudou a levar um sorriso a um público global.

“Nas mídias sociais, as pessoas me agradeceram por fazer todo mundo se sentir bem, pelo menos durante algum tempo”, recorda Jaime com orgulho. “Parte de minha motivação foi minha filha e as crianças em geral”, diz ele.

“São frágeis e não entendem o que está acontecendo. Minha filha não queria sair para caminhar, mas gostou de sair fantasiada com o pai.” Jaime espera que suas ações tenham ajudado outras crianças a ter menos medo de se aventurar pelo mundo.

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Na França, dois comediantes se inspiraram nos pregoeiros públicos dos tempos antigos da cidade para levar algum calor humano aos moradores isolados em seu prédio em Lyon.

Toda noite, os moradores se reuniam nas varandas para ouvir Valéria

Cardullo e Alex Repain anunciar pedidos de ajuda, desejar feliz aniversário ou propor algumas charadas. “Quando começamos, não achamos que o impacto seria tão grande, mas em pouco tempo um verdadeiro espírito de solidariedade surgiu”, recorda Alex.

Em outros lugares, a música foi um meio popular de animar a alma. Em Budapeste, integrantes da Orquestra Sinfônica MAV saíram pela cidade
e arredores em dois carros com alto-falantes tocando antigas apresentações para os que estavam confinados em casa.

Olivia Haynes passou a tocar ukulele na janela do apartamento e ajudou
a promover a sensação de comunidade entre os vizinhos em Viena.

Em Viena, a americana Olivia Haynes decidiu tocar seu ukulele na janela do apartamento para levar um pouco de luz e diversão à vida dos vizinhos.

Para sua surpresa, além de entretê-los ela também ajudou a construir uma sensação de comunidade.

“Adoro ajudar os outros a se conhecerem, principalmente pessoas que normalmente não se encontrariam”, diz ela.

Com o passar dos dias, alguns vizinhos passaram a descer ao pátio para escutá-la tocar e, depois, ficavam conversando.

Mas não foram só os seres humanos que sofreram o efeito do isolamento provocado pela quarentena. Na Irlanda, o pescador Jimmy Flannery percebeu que Fungie, o famoso golfinho que vivia no litoral de Kerry desde 1983, foi repentinamente privado da atenção do público normal de turistas.

Ele notou que Fungie corria até os barcos de pesca que saíam do porto local na esperança de receber companhia ou guloseimas.

“Mas eles não tinham tempo para isso, estavam ocupados demais seguindo para as áreas pesqueiras”, conta Jimmy, que decidiu visitar Fungie algumas vezes por dia só para lhe fazer companhia.

“Espero que ele tenha gostado”, diz Jimmy, rindo. “E espero que não tenha me esquecido, agora que seus admiradores voltaram.”

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Além dos efeitos espirituais do isolamento, a quarentena trouxe outras dificuldades. Para alguns, obter alimento suficiente foi um problema grave, como para os moradores do interior remoto da Austrália.

Gary Frost, dono de um bar de beira de estrada no Território do Norte, talvez tenha encontrado a solução mais extremada para o desafio de levar comida a quem precisava: como tem brevê de piloto, decidiu transportar as refeições por via aérea, sem custo extra, aos que estavam isolados em fazendas de criação de gado.

“Ninguém podia ir a lugar nenhum, e as fontes de alimentos e bebidas eram limitadas. Achamos que poderíamos ajudá-los um pouquinho”, recorda Gary, um australiano do tipo que põe a mão na massa.

“Como já fazíamos pizzas, achamos que, se levássemos de avião, ninguém precisaria sair da propriedade. Acho que não existe nada igual. Não soube de mais ninguém que tenha feito isso no mundo.”

Gary faz questão de afirmar que não fez isso com fins comerciais, mas como “um gesto amistoso para ajudar os outros”.

A jovem empreendedora parisiense Maud Arditti se inspirou na experiência das pessoas mais próximas e queridas para oferecer comida aos profissionais de saúde.

“Muitos parentes e amigos são médicos e trabalham em hospital”, conta ela. “Conversei com minha tia e descobri que, geralmente, o restaurante do hospital estava fechado, e cinco pessoas acabavam dividindo um único prato de macarrão.”

A iniciativa Vos Gâteaux fez bolos e doces para profissionais de saúde. A notícia se espalhou depressa pelas mídias sociais, e logo a ideia foi copiada em toda a França.

Maud começou a fazer bolos, pizzas e pequenas quiches para o hospital local, mas logo percebeu que não iria longe sozinha. O pedido de ajuda nas mídias sociais recebeu uma resposta extraordinária; no final, cerca de 1.600 ajudantes faziam bolo em toda a Paris para mandar aos hospitais.

Logo, a iniciativa Vos Gâteaux (seus bolos), de Maud, se espalhou por outras cidades francesas.

“Estávamos num impasse, e acho que nesses momentos podemos identificar três tipos de personalidade”, reflete Maud. “Aqueles que ficam meio paralisados, aqueles que criticam tudo o que se faz… e aqueles que não têm medo e dizem a si mesmos que dedicarão toda a sua energia e os meios que tiverem para ajudar. Com nossos bolos, pudemos alimentar e levar um pouco de doçura a todos os hospitais.”

Em outros locais, a comida para quem precisa veio de fontes inesperadas. Entre elas, um grupo de gondoleiras de Veneza, que entregaram hortigranjeiros orgânicos a idosos, e um violinista temporariamente desempregado da Orquestra Filarmônica de Helsinque, que entregou comida a aposentados com sua bicicleta elétrica.

“Era algo grande para quem recebia, e assim se tornou grande para mim também”, diz Teppo Ali-Mattila, um dos muitos trabalhadores da cultura e do esporte na cidade que ajudaram idosos.

Em Lisboa, Ramia Abdalghani e Alan Ghumim, um jovem casal sírio, ofereceram comida de seu restaurante gratuitamente aos funcionários do hospital local. Eles chegaram a Portugal como refugiados quatro anos antes e ficaram contentíssimos por ajudar sua nova comunidade.

“Quem foge de uma guerra sente o desastre, mas também percebe quem está ali para ajudar”, diz Alan.

“Assim, em todas as coisas que fazemos aqui em Portugal, tentamos retribuir ao povo que nos recebeu de braços abertos.” Um desses funcionários agradecidos do hospital foi o enfermeiro Nuno Delicado. “Foi uma grande lição de vida para todos nós”, recorda ele. “Mostrou que, como sociedade, temos de nos ajudar mutuamente.”

Um espírito semelhante inspirou cinco sírias de Aberystwyth, no País de Gales, que doaram 100 refeições ao hospital local para agradecer pelo trabalho do serviço de saúde. “As pessoas daqui são muito simpáticas, é importantíssimo ajudá-las”, conta Latifa, uma das mulheres.

“Nessa época preocupante, deveríamos todos trabalhar juntos. Eu realmente me preocupo com nossa nova comunidade e queria agradecer.”

Um homem do Reino Unido ofereceu anonimamente a dádiva do alimento. Um doador misterioso da aldeia de Denchworth, em Oxfordshire, comprou peixe com fritas para todos os moradores uma vez por semana durante os três meses de quarentena.

“Ele não quer ser foco de atenção por isso e acha que pessoas como ele, que têm a sorte de estar nessa situação, deveriam fazer algo pela comunidade, caso possível”, explica o taberneiro local Stephen Davidson, recrutado para fornecer as refeições.

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A pandemia também demonstrou que podemos ser engenhosos quando há oportunidade. Especificamente, muita gente usou seu talento e imaginação para criar equipamento de proteção individual para os profissionais de saúde.

Na pequena cidade de Elda, a sudoeste de Alicante, na Espanha, um grupo de mulheres que vivem de costurar sapatos em casa passou a fazer milhares de máscaras para o hospital próximo. Usaram tecido fornecido pelo hospital e elásticos doados por uma empresa local.

A iniciativa provocou um dilúvio de pedidos de informações de grupos de todo o país que queriam fazer a mesma coisa.

Até crianças participaram da criação do importantíssimo equipamento de proteção.

Na Irlanda, Conor Jean, de 14 anos, e o irmão Daire, de 11, criaram uma pequena linha de produção de máscaras faciais em sua casa no condado de Kildare, usando uma impressora 3D.

Eles chegaram a incorporar características especiais para que médicos ou enfermeiros de óculos tivessem mais facilidade de usar as máscaras. “Tenho o máximo orgulho desses meninos”, comentou a mãe, Lorraine Duffy, depois que eles terminaram o primeiro lote.

Talvez o exemplo mais maluco de engenhosidade seja o do sapateiro romeno Grigore Lup, que lançou um par de sapatos tamanho 190 cm. A ideia foi forçar os usuários a ficar a 1,5 metro uns dos outros e, assim, assegurar o distanciamento social. O sapateiro transilvano de 55 anos leva dois dias para fazer um par com um metro quadrado de couro.

O desejo de cuidar dos idosos, que correm mais risco com o coronavírus, também fez as pessoas pensarem fora da caixinha

Tristan Van den Bosch, por exemplo, gerente de operações de uma empresa de limpeza e manutenção no subúrbio de Watermael-Boitsfort, em Bruxelas, um dia, indo de carro para o trabalho, viu um homem gritando para uma mulher idosa.

O homem estava na calçada e a mulher, mãe dele, três andares acima, numa casa de repouso. Como muitos cidadãos idosos, ela não podia receber visitas por causa do vírus. Tristan pensou: Podemos ajudar esse homem!

O trabalho tinha praticamente parado na empresa de Tristan, ou seja, ele tinha guindastes à toa no depósito. Por que não usá-los para erguer as pessoas e deixá-las mais perto dos entes queridos? Assim, Tristan começou a percorrer a Bélgica em seu guindaste, levando famílias à janela dos parentes nos andares superiores das casas de repouso.

“Tudo bem, causou despesa”, diz Tristan. “Mas no fim ficamos contentes de ter ajudado os outros.”

No Brasil, a equipe da casa de repouso Três Figueiras, em Gravataí, demonstrou engenhosidade suficiente para criar uma forma inteiramente nova de proteger os moradores idosos quando recebiam visitas.

A casa de repouso Três Figueiras inventou o Túnel do Abraço, cujas mangas plásticas permitiram que moradores e visitantes se abraçassem com segurança.

“Notamos que os nossos idosos estavam ficando tristes”, diz a proprietária Luciana Brito. “E achamos que eles ficariam muito mais felizes se déssemos um jeito de abraçarem os parentes.”

Inspirados num vídeo viralizado que mostrava uma americana usando uma cortina plástica para abraçar a mãe, Luciana e os colegas resolveram criar o Túnel do Abraço: uma grande cortina plástica transparente com furos para os braços, pendurada numa das entradas da instituição.

Dos furos se projetavam mangas de plástico, e assim os visitantes podiam abraçar os entes queridos sem contato direto com eles.

“Foi muito gratificante ver as pessoas se abraçarem depois de tanto tempo, e importantíssimo”, diz Rubia Santos, a diretora.

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Quando Valerie Martin, diretora da casa de repouso Vilanova, perto de Lyon, na França, soube que residentes de lares da Europa toda sofriam com o vírus, decidiu tomar providências drásticas.

“Eu disse a mim mesma: não, os meus não. Os meus velhinhos ainda têm muito que viver”, afirma ela.

A solução de Valerie foi fechar por completo o prédio e convidar funcionários e enfermeiros a se unirem a ela num período de quarentena que, segundo esperava, duraria três semanas.

Vinte e nove funcionários foram voluntários. A quarentena se transformou numa maratona de 47 dias e noites, e 12 deles permaneceram o tempo todo. Valeu a pena. No fim do período, quando a média nacional de novos casos caiu drasticamente e os portões de Vilanova foram destrancados, os exames de coronavírus deram negativo para todos os 106 moradores.

Os cuidadores, que se intitulavam “os alegremente confinados”, saíram num desfile de carros, tocando a buzina no caminho de volta a cônjuges e filhos.

Valerie foi saudada como heroína pelo esforço, mas diz que no fim das contas não foi um sacrifício tão grande. “Foi meio como entrar num acampamento de férias”, diz ela, rindo. “Viver em isolamento com 130 pessoas é extremamente compensador.”

Nos Países Baixos, 150 mil idosos de casas de repouso ou que moram sozinhos se surpreenderam ao receber um buquê de flores coloridas na Sexta-Feira da Paixão. A iniciativa foi encabeçada pelo rapper holandês Ali B e organizada pelo setor de floricultura do país.

Os buquês eram acompanhados de uma mensagem de amor e esperança. “A solidão nunca tinha chegado tão perto”, disse Ali. “Agora é sua mãe. Ou o vizinho.”

E, na França, na Bélgica, em Luxemburgo, no Reino Unido e na Suíça, os idosos isolados em casas de repouso receberam bilhetes de esperança e felicitações de desconhecidos graças a um grupo de dez primos franceses que lançaram o site 1 Lettre 1 Sourire (uma carta, um sorriso).

“Pessoas que receberam as cartas disseram que elas eram raios de sol na vida cotidiana”, revela Alienor Duron, um dos fundadores.

“E cuidadores de idosos dessas casas de repouso nos disseram que a iniciativa foi extraordinária para eles também, por verem que eram apoiados dessa maneira. Também tivemos um retorno excelente das pessoas que escreviam as cartas, ao nos contarem que era muito gratificante para eles.”

Outro grupo muito vulnerável à pandemia são os moradores de rua. Em muitos locais, os banheiros públicos e os abrigos foram temporariamente fechados. Com menos gente nas ruas, havia menos oportunidades para ganhar algum dinheiro vendendo jornais ou tocando música.

E, como explica Wilhelm Nadolny, chefe da cozinha para moradores de rua que fica atrás da estação de trem do Zoológico de Berlim: “Como ficar em casa quando não se tem casa?”

Em Berlim, cerca de 2 mil pessoas moram oficialmente nas ruas, embora se acredite que o número seja muito maior.

O refeitório de Nadolny teve de fechar as portas, mas continuou a servir sanduíches e bebidas quentes por uma janela que dava para a rua. “E, apesar de todos os problemas, novos tipos de solidariedade surgiram”, diz Wilhelm.

Um exemplo foi um ônibus especial com o lema #GemeinsamFürBerlin (Juntos por Berlim) que percorreu a cidade entregando a moradores de rua pacotes de mantimentos de vinte supermercados Edeka da cidade.

E, em muitas outras cidades alemãs, as chamadas “Gabenzäune” (cercas de doações) começaram a surgir: cercas locais em que as pessoas penduravam sacolas contendo alimentos, produtos de higiene e roupas para os sem-teto.

A França viu surgir o movimento #PourEux (por eles). Voluntários preparavam em casa refeições entregues aos necessitados por outros voluntários.

“Todo mundo pôde ajudar dentro de suas possibilidades”, recorda Maxime Klimaszewski, voluntário de 28 anos. “Não exigiu muito tempo nem muito dinheiro, mas ajudou mesmo um grande número de pessoas.”

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Levada pela necessidade, Jyoti Kumari pedalou 1.200 quilômetros até a
aldeia rural da família, levando como passageiro o pai incapacitado.

Talvez as histórias que fiquem mais tempo na lembrança sejam as que envolveram grande sacrifício pessoal pelo bem dos outros. Vejamos Jyoti Kumari, de 15 anos, por exemplo, que pedalou 1.200 quilômetros pela Índia, levando o pai incapacitado na traseira da bicicleta.

O sofrimento começou em Nova Délhi, onde o pai Mohan Paswan ganhava a vida dirigindo um autorriquixá até que se feriu e perdeu o emprego.

Todas as viagens não essenciais tinham sido proibidas, mas o proprietário exigia o aluguel que pai e filha não tinham condições de pagar; os dois foram ameaçados de despejo, recorda Jyoti com lágrimas nos olhos.

Assim, ela decidiu que a única coisa a fazer era gastar o resto do dinheiro que os dois tinham numa bicicleta barata para voltar à aldeia natal de Darbhanga, no estado de Bihar.

Jyoti pedalou dez dias no calor escaldante, vivendo de comida e água doadas por desconhecidos. Em dois dias, só houve comida suficiente para o pai, e ela teve de aguentar a fome.

“Foi uma viagem difícil”, afirma ela hoje, subestimando muito seu feito. “Fez calor demais, mas não tínhamos opção. Eu só pensava numa meta: voltar para casa.”

Quando os dois por fim chegaram ao destino, a notícia da viagem tinha se espalhado, e Jyoti ficou famosa; mas ela afirma que a fama foi a última coisa que lhe passou pela cabeça quando começou a viagem.

“Foi uma decisão tomada com desespero”, conta.

Perto do 100º aniversário, o capitão Tom Moore resolveu arrecadar mil libras para instituições de saúde dando 100 voltas no quintal. No fim, obteve 33 milhões.

O potencial de um gesto simples de atrair a atenção do público em tempo de crise foi ilustrado pelo capitão Tom Moore, veterano do Exército britânico de 99 anos, que decidiu arrecadar algum dinheiro para os pacientes e profissionais de saúde.

Inspirado pelo atendimento excelente que recebeu no hospital ao tratar o câncer de pele e uma fratura de quadril em 2018, ele prometeu no início de abril dar 100 voltas no quintal, usando seu andador como apoio, antes do 100º aniversário no fim do mês. A meta era obter modestas mil libras.

Mas o relato da iniciativa do capitão Tom logo chegou aos ouvidos de um
país desesperado por boas notícias no meio do isolamento.

Ele apareceu nos jornais e na TV e até se juntou ao cantor Michael Ball e a um coral de profissionais de saúde para gravar uma versão de caridade de “You’ll Never Walk Alone” (famoso hino do time de futebol de Liverpool) e se tornar a pessoa mais velha a chegar ao topo das paradas de sucesso do Reino Unido.

Em 16 de abril, o capitão Tom terminou as suas 100 voltas antes da data marcada e levantou mais de 17 milhões de libras. “Nunca sonhei em me envolver numa ocasião como essa”, anunciou.

Mas era só o começo. A mania do capitão Tom não mostrou sinais de diminuir, e as pessoas prestara várias homenagens à sua iniciativa, como tricotar bonecos e pintar murais.

Quando comemorou o centésimo aniversário em 30 de abril, ele conseguira
quase 33 milhões de libras. Foi homenageado por uma exibição da força aérea da Grã-Bretanha, e o público lhe mandou mais de 150 mil cartões de felicitações.

A resposta dele: “A todas as pessoas que enfrentam dificuldades no momento… O sol voltará a brilhar, e as nuvens irão embora.”

Em homenagem a essa realização extraordinária, o capitão Tom foi promovido ao posto de coronel honorário, recebeu a condecoração Liberdade da Cidade de Londres e foi feito cavaleiro por recomendação do primeiro-ministro. O dinheiro obtido foi usado para oferecer conforto e tratamento aos trabalhadores do Serviço Nacional de Saúde.

“Nunca fui de ficar sentado olhando”, diz ele, rindo, e acrescenta que gostou
do desafio. “A primeira volta foi a mais difícil, mas depois acho que me acostumei.”

E ele acredita que o segredo do sucesso e da vida longa é simples: “A
questão é ter a mentalidade certa. É preciso ser otimista e achar que tudo
vai melhorar.

por Tim Hulse