Osteoporose: uma epidemia silenciosa e perigosa

É mais fácil do que nunca prevenir e tratar a osteoporose, mas o número de casos está aumentando. Como evitar que você seja vítima?

Douglas Ferreira | 10 de Março de 2020 às 14:00

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A osteoporose, palavra que significa “osso poroso”, surge quando as células ósseas que se decompõem não são substituídas por novas. Isso faz os ossos se quebrarem com mais facilidade e levarem mais tempo para sarar quando se quebram.

O que dizem as estatísticas?

No decorrer da vida, 50% das mulheres terão uma fratura ligada à osteoporose, risco maior do que o de infarto, AVC e câncer de mama combinados. Nos homens, a probabilidade é de um em quatro; um homem com mais de 50 anos tem mais probabilidade de sofrer esse tipo de fratura do que de ter câncer de próstata.

Mais de 10 milhões de brasileiros sofrem de osteoporose e, segundo um estudo de 2018 do Hospital das Clínicas de São Paulo, 20% dos idosos que sofrem fratura no fêmur ligada à osteoporose não voltam a andar de maneira independente e 30% morrem após um ano.

O que torna a osteoporose ainda mais trágica é que, nos últimos 25 anos, a doença passou a ser tratável e pode ser prevenida. Os exames de absorciometria por raios X com dupla energia (DEXA), que medem o cálcio e outros sais minerais dos ossos, são tão precisos que a Organização Mundial da Saúde os usa como critério para diagnosticar a osteoporose e sua precursora, a osteopenia. Os exames DEXA também são eficazes para prever o risco de fraturas.

Os bisfosfonatos e outros medicamentos que tratam a baixa densidade óssea reduzem em 40% o risco de fraturas em mulheres e até 67% nos homens.

Mas, apesar desses avanços, as fraturas estão ficando mais comuns. Segundo um estudo de 2018, depois de uma década de declínio, entre 2013 e 2015 o número de fraturas de quadril subiu 2,5% em mulheres com 65 a 69 anos e 3,8% em mulheres com 70 a 74 anos. O Dr. E. Michael Lewiecki, principal pesquisador e diretor do Centro de Pesquisa Clínica e Osteoporose do Novo México, estima que 11 mil fraturas de quadril e 2 mil mortes poderiam ter sido evitadas naqueles três anos.

Como se explica esse aumento das fraturas?

A profunda incompreensão sobre o que realmente afeta os ossos, o medo exagerado dos medicamentos que reforçam os ossos, as mudanças da cobertura de exames ósseos pelos planos de saúde e a ideia de que “estou me sentindo bem, logo estou bem” da geração que está envelhecendo, tudo isso se combinou para deixar nossos ossos em perigo. “Medimos a pressão arterial e o nível de colesterol regularmente, mas muita gente se esquece de testar a saúde óssea”, adverte o Dr. Lewiecki. Se não quiser ser vítima, lembre-se desses importantes achados da medicina.

Exames de densitometria óssea são fundamentais

A única maneira de saber se você tem osteopenia ou osteoporose é com o exame de densitometria óssea. Os exames DEXA são o padrão-ouro recomendado pela Fundação Americana de Osteoporose (NOF, na sigla em inglês) para mulheres com 65 anos ou mais, homens com 70 anos ou mais e já aos 50 anos para quem pertence a grupos de risco, como mulheres pós-menopausa, fumantes, pessoas abaixo do peso, quem bebe mais de duas doses de bebida alcoólica por dia, tem histórico familiar de osteoporose ou já sofreu fraturas. Mas não espere que o médico peça o exame. A pesquisa mostra que quem já sofreu uma fratura apresenta probabilidade nove vezes maior de ter outra. Mas, numa pesquisa de 2017 da NOF, 96% das mulheres que sofreram fraturas disseram que nem assim o médico prescreveu o exame.

“Depois de um infarto, as pessoas são avaliadas e postas num plano de medicação e mudanças do estilo de vida para prevenir outro. O mesmo deveria acontecer depois de uma fratura”, diz o Dr. Bart Clarke, presidente da Sociedade Americana de Pesquisa Óssea e Mineral e pesquisador do Colégio de Medicina e Ciência da Clínica Mayo.

Nos Estados Unidos, grande parte do problema é que o número de médicos particulares com máquinas DEXA caiu 26% desde 2007, quando o Medicare, plano de saúde gerido pelo governo, reduziu o valor pago por exame. A maioria dos hospitais ainda oferece o exame, mas, em áreas rurais, os pacientes têm de viajar horas para fazê-lo. Em consequência, desde 2008 quase 3,7 milhões de mulheres que dependem do Medicare deixaram de fazer exames de densitometria óssea, em relação ao que estava previsto.

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No lado positivo, em 2018 uma coalizão de grupos ligados à saúde óssea recomendou que, depois de uma fratura de quadril ou de coluna, todos os profissionais de saúde envolvidos no tratamento – dos médicos do pronto-socorro aos ginecologistas, ortopedistas, fisioterapeutas e nutricionistas – garantam que seja realizado um exame ósseo e, se necessário, tratamento.

Isso já está acontecendo com bons resultados em cerca de 200 centros médicos dos Estados Unidos. Um programa da Califórnia, por exemplo, reduziu em até 60% a taxa de segundas fraturas em apenas quatro anos.

Se você tiver menos de 40 anos e fatores de risco da osteoporose, não é cedo demais para conversar sobre o exame com o médico. Enquanto isso, quem tiver 40 anos ou mais pode estimar seu risco de fratura na Ferramenta de Avaliação de Risco de Fratura (FRAX, na sigla em inglês), que, embora seja em inglês, conta com um campo para o Brasil. O FRAX não substitui o exame ósseo, mas é um bom modo de ajudar a decidir se você precisa dele ou se corre risco de fratura nos próximos dez anos.

Os homens (e algumas pessoas mais jovens) devem fazer o exame também

A osteoporose não é uma doença exclusiva das mulheres. Don, aposentado da Flórida que hoje tem 74 anos (ele pediu que não usássemos seu sobrenome), recebeu o diagnóstico de osteoporose aos 44 anos, apesar da vida ativa que incluía caminhadas diárias e 65 km de pedaladas semanais. “Sofri uma distensão da coluna, e as radiografias mostraram que ela estava se deteriorando”, relata ele. “Tenho osteoporose na família, embora ache que sou o único homem que herdou a doença.”

Os cientistas não sabem por quê, mas os homens têm risco de morte maior do que o das mulheres depois de uma fratura de quadril causada pela osteoporose. Portanto, é ainda mais importante que os homens façam exames e se tratem, se necessário. O resultado do exame DEXA de Don melhorou depois de um ano de tratamento com bisfosfonato.

A história de Don também demonstra que pessoas mais jovens correm cada vez mais risco. Embora a osteoporose seja mais comum em mulheres com mais de 60 anos e homens com mais de 70, um estudo de 2018 da Universidade de Nevada constatou que a densidade óssea média de pessoas com apenas 30 anos era muito mais baixa em 2014 do que em 2005.

Provavelmente, a principal razão do declínio é ficar sentado tempo demais, com pouquíssima atividade física, concluíram os pesquisadores. Mas há outros fatores de risco surpreendentes, como cirurgia bariátrica, diabetes, câncer de mama e poluição do ar. Todos estão associados a problemas ósseos, assim como a terapia de privação androgênica (para tratar o câncer de próstata) e os corticosteroides (usados na artrite reumatoide).

Suplementos sozinhos não bastam

Um estudo constatou que cerca de três em dez mulheres pós-menopausa acreditam que basta tomar leite ou suplementos de cálcio para prevenir as fraturas. Mas a pesquisa sobre o cálcio e sua parceira, a vitamina D, é inconclusiva. Duas grandes revisões recentes de estudos bem projetados indicam que o cálcio e a vitamina D não reduzem o risco de fraturas. Mas um estudo de 2018 mostrou que a maior ingestão de laticínios está associada a densidade mineral óssea e força vertebral maiores em homens.

Por enquanto, a maioria dos especialistas sugere ingerir 1.000 a 1.200 mg de cálcio e 400 a 4.000 UI de vitamina D por dia na alimentação. (Um copo de leite contém 30% do cálcio recomendado e 25% da vitamina D.) Há cálcio em verduras crucíferas como couve e brócolis, em sardinhas enlatadas com ossos e em flocos de cereais enriquecidos; salmão, atum e gema de ovo contêm vitamina D e cálcio.

Se não conseguir ingerir o suficiente com a comida, o Dr. Clarke recomenda suplementar com 500 mg de cálcio e 600 UI de vitamina D para pessoas com menos de 70 anos e 800 UI depois dessa idade. “Também é importante ter uma dieta saudável em geral, com proteína suficiente, sem exagerar no álcool, na cafeína, nos refrigerantes e nos carboidratos refinados”, acrescenta ele.

Observe que nenhum suplemento impede comprovadamente fraturas em pessoas com osteoporose, afirma o Dr. Clarke. Alguns podem até ser prejudiciais, como o estrôncio, alardeado como bom para ossos fortes e que agora saiu das prateleiras na Europa depois que a Agência Europeia de Medicamentos alertou os consumidores contra o seu por causa do aumento da incidência de coágulos e infartos.

Tome medicamentos para proteger os ossos se o médico prescrever

Os bisfosfonatos, como o alendronato e o ibandronato, reduzem o risco de fratura por desacelerar a decomposição das células ósseas. Eles são os medicamentos mais receitados para osteoporose porque funcionam. Mas costumam ser um tema muito debatido por motivos errados, quando recém-diagnosticados entram em grupos de apoio da osteoporose, como o Bone Boosters, do Novo México. “As pessoas ficam apavoradas”, comenta Marge Peterson, professora aposentada de 77 anos que criou o grupo. “Viram muita publicidade negativa e desinformação na internet ou foram assustadas por outras pessoas que falavam dos efeitos colaterais.” Nos Estados Unidos, por exemplo, o número de pessoa que tomam bisfosfonatos caiu mais de 50% entre 2008 e 2012, segundo um estudo dos Institutos Nacionais de Saúde.

Sem dúvida, há efeitos colaterais: dores musculares e articulares, náusea, azia e úlceras gástricas. Mais raramente, os medicamentos podem causar erosão da mandíbula; um em 10 mil pacientes pode sofrer fratura do fêmur. Mas, segundo a Dra. Andrea Singer, diretora médica da NOF, os riscos “são baixíssimos, muito mais baixos do que o risco de fratura ligada à osteoporose não tratada”. O médico pode recomendar “férias do remédio” ou medicamentos alternativos.

Alguns tratamentos mais novos são muito promissores. Um estudo inovador de 2018 com 2 mil mulheres com osteopenia verificou que o zoledronato (outro bisfosfonato) reduziu em cerca de um terço o risco de fratura. O raloxifeno e o denosumabe são alternativas aos bisfosfonatos que também ajudam a retardar a decomposição óssea. A teripatida e a abaloparatida, medicamentos mais recentes para osteoporose aprovados pelo governo americano, funcionam de outra maneira; na verdade, eles ajudam a criar osso novo.

Até pouco exercício faz bem

Exercícios de alto impacto como dançar, correr e pular corda ajudam a manter os ossos fortes, assim como caminhar, usar a máquina elíptica ou o simulador de escada. Movimentos para fortalecimento muscular são bons, ioga também.

Antigamente, os exercícios de alto impacto eram desaconselhados para pessoas com osteoporose por causa do risco de quedas e fraturas. Mas um estudo de 2017 constatou que basta meia hora de exercícios de alta intensidade, duas vezes por semana, para aumentar a densidade, a estrutura e a força ósseas em mulheres pós-menopausa com baixa densidade óssea, sem efeitos negativos. E uma revisão recente comprovou que combinar exercícios com medicamentos que promovem a ossificação aumenta mais a densidade óssea de pessoas com osteoporose do que estratégias isoladas.

Quer evitar fraturas? Uma das melhores coisas que você pode fazer é se exercitar.

POR SARI HARRAR