Ovos: uma força da natureza na sua cozinha

Em 1911, um jornalista do Canadá chamado Joseph Coyle ouviu uma discussão. Se tratava de um hoteleiro e um fazendeiro que trocavam acusações sobre

Redação | 19 de Abril de 2019 às 19:00

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Em 1911, um jornalista do Canadá chamado Joseph Coyle ouviu uma discussão. Se tratava de um hoteleiro e um fazendeiro que trocavam acusações sobre quem era o responsável pelo ovo quebrado encontrado na embalagem comprada e entregue. Isso inspirou Coyle a experimentar uma solução robusta – feita, é claro, de jornais. Alguns anos depois, suas embalagens seguras para ovos decolaram.

Hoje, você vai me encontrar dentro de um modelo parecido de embalagem, aninhado em geladeiras do mundo inteiro, pronto para começar o dia. E pela manhã é mais provável que os seres humanos de olhos sonolentos me tirem daquela embalagem de papel para me levar à panela.

As pessoas me preferem no café da manhã desde pelo menos 1620, quando um escritor médico britânico, de nome Tobias Venner, sugeriu ovos pochê com vinagre pela manhã.

Quatro séculos depois, você acorda comigo nas versões mais maravilhosas: mexido, cozido, batido em omelete, supermolinho, gema para cima, assado no forno, dentro do pão, em conserva, no bolovo e até a cavalo no bife.

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A qualquer hora do dia, a culinária do mundo inteiro desmoronaria sem mim. Para cozinhar e assar, talvez não haja ingrediente tão fundamental quanto eu, com a possível exceção do sal. Sou necessário em pudins e molhos cremosos, suspiros e suflês. Sem mim, você não teria maionese, molho hollandaise, profiteroles, pastéis de nata, massas de biscoitos e bolos, além de certos macarrões e pães.

O café da manhã seria terrível: sem waffles, panquecas nem rabanadas. Há muitos ingredientes que podem ser retirados da alimentação humana sem alterar a essência da tradição culinária. Mas me remova e você abrirá uma cratera fumegante bem no meio da cozinha.

Sou mais do que um companheiro culinário essencial. Também sou uma das fontes mais perfeitas de nutrição encontradas na natureza. Minha gema é repleta de pigmentos vegetais antioxidantes chamados xantofilas (os mesmos que deixam as folhas amarelas no outono) e uma série de nutrientes: proteína, folato, B12 , colina e selênio.

E há o meu colesterol. Durante anos, acharam que os seres humanos deveriam evitá-lo. Não mais. Hoje, os especialistas dizem que o colesterol ingerido com a gema não se transforma necessariamente em nível elevado de colesterol no sangue.

Meu conteúdo nutricional não é superlativo por acaso. Ao contrário da carne e das plantas, que têm vida própria até você decidir transformá-las em comida, fui projetado como alimento. Não para você: sou sustentação, respirador e sistema de segurança do pinto, e tenho em mim tudo o que ele precisa para passar de uma única célula fertilizada a uma bolinha de penas que pia.

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Comece por minha casca. Apesar da aparência, ela é porosa e deixa o dióxido de carbono sair e o oxigênio entrar para o pintinho. Por essa razão, absorvo cheiros fortes. É por isso que os chefs maximizam a ação de suas caríssimas trufas guardando-as em recipientes com ovos; absorvemos o aroma pela casca e assim fazemos um delicioso ovo mexido com cogumelos sem na verdade usar nenhuma trufa.

Outra coisa sobre a casca: ela sai mais facilmente se eu for cozido 15 dias depois de posto, em vez de na mesma hora. A dúzia que você comprou – cada um posto por uma galinha diferente, pois a ave demora de 24 a 36 horas para produzir um único ovo – geralmente não tem mais do que uma semana, e às vezes o ovo foi posto somente um ou dois dias antes de chegar à prateleira das lojas.

Dentro da casca, as gorduras e proteínas que tenho para sustentar o pinto explicam minha alquimia na cozinha. A gema gordurosa contém um emulsificador poderoso chamado lecitina que os chefs usam para combinar inimigos – vinagre e azeite, limão e manteiga – em molhos e coberturas lisos e sedosos.

Enquanto isso, quando você me cozinha, as proteínas invisíveis e emaranhadas que flutuam dentro de mim se desenrolam e se engancham num andaime cuja rigidez aumenta com o calor. É por causa dessa reação que um ovo aquecido lentamente ficará cremoso, enquanto o frito em calor elevado ficará quase borrachento.

Um efeito relacionado acontece quando você usa o batedor: quando as claras são batidas, as proteínas desenroladas se engancham para formar picos espumosos, primeiro moles, depois mais firmes e espetados. Bata demais e esse andaime de proteínas vai se enganchar tanto que a água sairá como se fosse espremida de uma esponja, e vem daí aquele caldinho em torno das claras muito batidas.

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Juntas, essas características fazem de mim uma das coisas mais simples e, ao mesmo tempo, mais complicadas de preparar. Não é preciso quase nenhuma habilidade para fazer um ovo cozido ou para fritá-lo num pouco de azeite.

Mas um chef exigente que queira selecionar um candidato a cozinheiro pode descobrir praticamente tudo que precisa saber pelo modo como o candidato prepara uma omelete francesa clássica. Saiba que ela deve ser firme, porém não escurecida por fora, úmida e levemente mole por dentro – um pacote perfeitamente macio.

Obter isso exige delicadeza e pulso com muita prática – mas o teste só precisa de alguns minutos, três ovos, uma frigideira e um garfo.

Fácil, mas difícil; frágil, mas poderoso. Esse sou eu, multifacetado – o supremo alimento, guardado numa embalagem de papelão sem graça em sua geladeira.

POR KATE LOWENSTEIN E DANIEL GRITZER