Eu sou a noz, muito prazer!

A noz é um alimento muito requisitado nas ceias de fim de ano. Conheça um pouco mais sobre a história dela e seus benefícios para a saúde!

Redação | 9 de Dezembro de 2019 às 14:00

Aksenovko/iStock -

No século 16, uma imprudente teoria sobre a saúde circulou entre os médicos da Europa: alimentos que lembrassem partes do corpo fariam muito bem à saúde dessas partes. Vaga-lumes para visão noturna, coral-vermelho para o sangue e euzinha aqui para o órgão mais importante de todos: o poderoso cérebro humano.

É verdade que nem o ser humano mais distraído deixaria de ver a semelhança, com meus hemisférios carnudos e convolutos enfiados numa casca protetora parecida com o crânio. No fim das contas, por mais desorientada que fosse a teoria, comigo esses cientistas tiveram sorte. Minhas gorduras poli e monoinsaturadas abundantes, além de meu nível alto e invejável de ômega-3 (sou a única oleaginosa com quantidade significativa dele), são realmente essenciais para a saúde cognitiva.

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Só para registrar, também sou uma estrela quando se trata da digestão, por ser muito rica em fibras. Mas os seres humanos se apaixonaram por mim antes que a ciência me desse todo esse crédito de alimento saudável. Faz muito tempo que meu sabor adocicado e a textura delicada me garantiram um lugar entre os mais deliciosos alimentos reconfortantes – em bolos e biscoitos, polvilhada sobre sorvetes, aninhada em pés de moleque ou dentro do chocolate, tostada com manteiga e coberta de açúcar e especiarias. Também não sou estranha às delícias salgadas, triturada em sopas e pestos ou picada nas saladas. Minha crocância leve e amanteigada (que fica ainda mais deliciosa se você me tostar até exalar a fragrância) me permite acrescentar aos pratos textura suficiente para deixá-los interessantes sem criar tensão nos maxilares. Não se pode dizer isso das amêndoas, por exemplo!

Na verdade, eu não sou uma noz!

Por falar em minha colega mais popular (mas, segundo alguns, menos fabulosa), talvez você se interesse em saber que, em termos botânicos, nenhuma de nós é uma noz – nem os pistaches e castanhas de caju, aliás. A noz é uma semente fechada dentro de uma casca externa dura, sem polpa no lado de fora. Pense nas castanhas e avelãs. No entanto, se me colher na árvore e não na prateleira do supermercado, você verá que sou um caroço dentro da camada verde e carnuda do fruto. E a parte macia que você come, na verdade, é a semente dentro daquele caroço. Se já abriu um caroço de pêssego e achou lá dentro uma semente em formato de amêndoa, você saberá ao que estou me referindo.

Por mais dura que seja minha casca, os óleos delicados encontrados nos lobos ficam rançosos facilmente. Se eu estiver amarga ou com cheiro de mofo, é melhor me deixar de lado. Se não for me comer na hora, guarde-me na geladeira ou mesmo no congelador, num saco plástico sem ar e hermeticamente fechado.

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Se colher meu fruto cedo, antes que o caroço tenha endurecido totalmente, você pode preparar algumas coisas inesperadas. Na Grã-Bretanha, fazem picles: me deixam inteira em água salgada e me preservam num xarope de açúcar mascavo e especiarias. Com isso, fico macia e delicada; você pode me fatiar e ver a semente, a protocasca e a borda da polpa da fruta. Mas o mais fascinante é a cor da noz em conserva: preta. Isso é porque meu suco leitoso e transparente escurece quando exposto ao ar.

Os jovens frutos da nogueira fornecem essa mesma cor de tinta ao nocino, o digestivo italiano em que sou macerada com açúcar e especiarias em elevado teor de álcool. Na Roma antiga, eles combinavam minha seiva escura com sanguessugas, cinzas e coisas carbonizadas para fazer tintura escura para cabelo. Meu suco também era usado para fazer corante de nogueira, que, segundo dizem, Rembrandt, Leonardo da Vinci e Rubens empregaram em alguns esboços.

Meu passado não me condena

A Encyclopedia of Hair (Enciclopédia do cabelo) explica que na Inglaterra, no século 17, o óleo extraído da minha semente era usado como depilador para afinar as sobrancelhas e recuar o limite do cabelo das mulheres, quando essa era a moda. Hoje, inexplicavelmente, o óleo de nogueira é divulgado como cura para a calvície. Basta dizer que é melhor não me usar com propósitos capilares.

Mas vocês, seres humanos, encontraram incontáveis aplicações para mim, como o abrasivo de limpeza feito com minhas cascas e usado até hoje. Nem sempre a ideia deu certo: em 1982, um helicóptero Chinook do exército americano caiu porque resíduos de casca de noz bloquearam os jatos de óleo que lubrificavam a transmissão do aparelho.

Mas minha função não comestível preferida é como veículo de investimentos. Os chineses veem meus melhores indivíduos como você veria uma pedra preciosa ou uma cerâmica fina. Posso valer quantias imensas no Oriente, e dizem que girar um par de exemplares meus na palma da mão estimula a circulação do sangue. Pares iguais podem valer até 30 mil dólares; quanto maiores e mais velhas, mais valiosas. Pense nisso da próxima vez que jogar na boca, como petisco, um punhado meu.

POR KATE LOWENSTEIN E DANIEL GRITZER

Atualmente, Kate Lowenstein é editora de saúde da revista Vice; Daniel Gritzer é diretor culinário do site de culinária Serious Eats.

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