Raspar o cabelo e assumir os brancos: mulheres se libertam dos padrões

Durante a quarentena, mulheres anônimas e famosas aproveitaram o isolamento para raspar o cabelo e assumir os brancos em um exercício de autoconhecimento.

Amanda Santos | 5 de Julho de 2020 às 20:40

Ridofranz/iStock -

Já pensou em raspar o cabelo? E em assumir os brancos? Muitas mulheres estão aproveitando o período de distanciamento social para testar mudanças no visual. Algumas delas, inclusive celebridades, resolveram assumir os cabelos grisalhos. Outras decidiram por algo mais radical: passar a máquina nos fios. Os motivos são diversos, como praticidade e o fim da dependência dos salões de beleza — que foram obrigados a fechar em diversas cidades.

Em comum, elas contam que há uma busca por autoconhecimento e uma vontade de não se sentir refém de padrões de beleza. Um desses exemplos vem da técnica de iluminação cênica Nathalia Dezoti, de 34 anos, que resolveu raspar todo o cabelo. Em um primeiro momento, ela afirma que se assustou com a imagem que viu no espelho.

“Já tinha essa vontade para ver se era libertador mesmo, foi bem difícil”, conta. Mas com o passar dos dias, Nathalia diz que passou a adorar o resultado. “Estou bem feliz, tenho essa sensação de que não preciso do cabelo para me sentir bonita, para me sentir mulher”, revela ela, que pretende deixar o visual por um bom tempo.

Além disso, a praticidade de não ter que se preocupar em ter cuidados constantes com os fios foi outro ponto que colaborou com a sua percepção e até a ajudou a tomar a decisão de raspar o cabelo. “Agora, eu já acordo pronta”, comenta.

Raspar o cabelo é tendência entre mulheres que querem se libertar de padrões. (Foto: Ridofranz/iStock)

Desapego, autoconhecimento e amor próprio

Para a empreendedora Maria Fernanda Teixeira, de 27 anos, raspar os fios durante o período de isolamento social foi um exercício de autoconhecimento e de amor próprio. Mas essa não foi a primeira mudança radical dela. Em 2018, Maria Fernanda cortou 40 centímetros de fios — que foram doados — e ficou com o cabelo bem curtinho.

Na visão dela, há uma cobrança na sociedade de como a mulher deve ser e se comportar. “E não basta ser feminina, a gente tem que se provar feminina o tempo todo. Cortar todo o cabelo é uma quebra disso. É dizer: ‘Eu não vou ser feminina do jeito que vocês dizem que eu tenho que ser, eu vou ser feminina do jeito que eu sou”, afirma.

Para a personal trainer e professora de ioga Glaucia Raffoul, de 33 anos, o cabelo longo e sempre muito bem arrumado era uma das suas principais vaidades. No entanto, ao começar a se aprofundar nos estudos da filosofia de ioga em 2015, ela conta que entrou em um processo de autoconhecimento e de desapego. Porém, o cabelo era algo inegociável. Até que veio a quarentena.

“E aí fui obrigada a olhar um pouco mais para dentro”, diz. Nesse processo, Glaucia decidiu raspar um lado do cabelo, um corte que ela achava bonito e estiloso. Depois, decidiu cortar os fios na altura dos ombros, um desejo antigo seu. Mesmo com algumas opiniões contrárias de amigos e conhecidos, ela diz que adorou o resultado e não se importou com o que os outros acharam. “Foi um exercício de desapego. Hoje, eu me sinto muito mais segura”, conclui. 

Assumindo os fios brancos

Desde os 27 anos, a hoje aposentada Elisabete Roza Villa Rios pinta o cabelo para cobrir os fios brancos. São mais de 30 anos fazendo tintura a cada 20 dias. Agora, aos 58 anos, e estimulada pela quarentena e por uma tendência cada vez maior de mulheres que resolveram assumir os fios grisalhos, ela também decidiu parar com a pintura.

“Já estava cansada de toda hora ter que pintar o cabelo. Como está sendo divulgado que o cabelo branco está na moda, pensei: quero ver como o meu fica”, relata ela, que diz admirar a postura da atriz Cássia Kis, de 62 anos, que há anos usa os fios grisalhos. No período de isolamento social, outras artistas também deixaram o cabelo natural como Fafá de Belém, 63, Tatá Werneck, 36, e Suzana Alves, 41.

Sem dúvida, o combo curto e grisalho é uma combinação poderosa. (Foto: Ridfranz/iStock)

Assim como Elisabete, a professora e veterinária Fernanda Fidelis Gonsales, 40, tem fios grisalhos desde antes dos 30 anos. Mas ela resolveu assumir os brancos em 2017, cansada de ter de retocar a raiz a cada 15 dias.

“Eu era uma escrava do meu cabelo, tinha que mudar compromisso para poder ir ao salão e fazer a tintura”, conta. Para facilitar na transição, na época, ela raspou o cabelo de um lado e deixou a outra parte bem curtinha. Com isso, conta que se livrou de um outro problema: o alisamento.

Mas como lidar com o preconceito?

Fernanda conta que quando começou a deixar os fios grisalhos, escutou de muitos amigos homens que ela estava parecendo mais velha. “Eles falavam: ‘Você parece ter 38, 39 anos’. E eu dizia: ‘Mas essa é a minha idade. O que eu posso fazer, eu estou envelhecendo’”, diz. Outra coisa que a veterinária diz ouvir muito, mas de mulheres na casa dos 60 anos, é que o branco fica bem nela por ela ser mais jovem. 

“No Brasil, se você tem cabelo branco, você é acabado, você é velho. Mas qual é o problema de ter cabelo branco? Eu vejo que as pessoas ao meu redor tem muito preconceito, e as mulheres sentem insegurança em relação a aceitar isso”, comenta.

Apesar de cabelos curtos serem a tendência, grisalho também combina com fios longos. (Foto: jacoblund/iStock)

No entanto, para ela tudo é uma questão de se sentir bem. Quando tinha 28 anos e o seu cabelo começou a ficar muito grisalho por causa de algumas situações estressantes que ela passou, Fernanda conta que não pensava em assumir a raiz branca. Porém, com o passar do tempo, ela diz que foi se conhecendo melhor e se aceitando do jeito que é. “Se para você é importante colorir, não tem problema. O que eu fico um pouco triste é com essa cobrança externa. Mas acho que cada um tem que ser feliz como quiser”, conclui.

KARINA MATIAS/FOLHAPRESS