Você já ouviu falar da “Dieta do Cartão de Crédito”?

Claudine Bakker, assistente administrativa, está desanimada. Faz anos que essa mãe de dois filhos tenta controlar o peso com dieta e não consegue.

Julia Monsores | 7 de Janeiro de 2020 às 14:00

damedeeso/ Istock -

Claudine Bakker, assistente administrativa, está desanimada. Faz anos que essa mãe de dois filhos tenta controlar o peso com dieta e não consegue. Em vez disso, engordou um ou dois quilos por ano e agora está dez quilos acima do peso ideal.

Frustrante é também a outra luta constante para domar as dívidas. Um empréstimo pessoal está demorando demais para ser pago; o extrato do cartão de crédito, então… Por que Claudine não consegue controlar nenhum dos dois? O Dr. Jay Zagorsky, cientista da Universidade do Estado de Ohio, acredita que sabe a resposta. Depois de um amplo estudo de 15 anos com mais de 7 mil participantes, a equipe de pesquisadores descobriu uma ligação significativa entre o peso e as finanças.

A equipe de Zagorsky descobriu que, quando os indivíduos conseguem emagrecer, o saldo bancário dá uma boa melhorada. No estudo, por exemplo, mulheres que perderam dez pontos no Índice de Massa Corporal (IMC) viram seu patrimônio aumentar em mais de 16 mil dólares.

“Economizar e fazer regime envolve muitos conceitos iguais”, diz o Dr. Zagorsky. É uma ideia simples que Peter Walsh, autor de Engordei ou minha roupa encolheu?, comprovou ser eficaz. Ele já ajudou milhares de pessoas a desentulhar a casa e, no mesmo processo, mudar de atitude em relação ao consumo, à perda de peso e ao endividamento.

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“Ninguém engorda porque vê pela frente um chocolate ou um hambúrguer”, diz Walsh. “A gente engorda, se endivida e entulha a casa por causa de decisões sobre comer e gastar. A casa, a cabeça, o coração e a cintura estão todos ligados. Tudo tem a ver com as decisões tomadas.”

Gratificação imediata ou retardada

Nossa cultura consumista não nos estimula a dizer não a nada nem a esperar, e talvez não seja por coincidência que os países com alto nível de obesidade também apresentem nível crescente de endividamento. Nos Estados Unidos, por exemplo, da década de 1970 ao ano 2000, a taxa de obesidade subiu mais de 110%, enquanto a de poupança pessoal caiu 83%. Ao lado de países como Finlândia e Espanha, hoje os EUA têm um dos níveis mais altos de obesidade e um dos mais baixos de poupança do mundo.

Brasileiros estão engordando mais

No Brasil, a situação não é muito diferente. Há quase três décadas, o peso do brasileiro vem subindo. E muito. Entre 1975 e 2003, segundo dados do Ministério da Saúde, o porcentual de excesso de peso entre as mulheres subiu de 28,6% para 39,2%. Entre os homens, o aumento foi ainda maior: de 18,6% para 41%. Curiosamente, o número de inadimplentes também vem crescendo. Dados da Serasa Experian revelam que o índice de inadimplentes saltou de 35,3 em setembro de 2000 para 113,7 em outubro de 2010. Ou seja, um aumento de 222,1%.

Segundo estimativas da Confederação Nacional do Comércio (CNC), o número de famílias endividadas no Brasil já ultrapassa a casa dos 8 milhões. E por que a situação escapou tanto ao controle, e como voltar aos trilhos? Para começar, ao contrário do passado, quando cozinhar exigia esforço e alimentos ricos em gordura eram uma parte pequena do cardápio, hoje há guloseimas tentadoras de todo tipo, baratas e disponíveis na mesma hora.

E é preciso esforço para resistir à tentação. O Dr. Rick Kausman, autor de If Not Dieting, Then What? (Se não é dieta, então é o quê?), observa:

9 perguntas para fazer antes de começar a dieta

“Hoje, todos querem uma ‘solução rápida’, mas o esforço continuado é a única maneira de emagrecer.” Walsh concorda: “Para mudar os hábitos, é preciso transformar a melhor opção em opção mais fácil. Se você entra pela porta morrendo de fome e não tem nada na geladeira, o mais provável é telefonar e pedir uma pizza.”

A boa notícia é que, assim como ninguém precisa manter uma dieta a base de maçã e alface para manter um peso saudável, não é preciso ganhar fortunas para se livrar das dívidas.

Larissa Davidovich, defensora pública do Núcleo de Defesa do Consumidor (Nudecon) do Estado do Rio de Janeiro, adverte que o endividamento é um mal que não escolhe vítimas.

“Basta a má gestão das finanças para que qualquer pessoa, que dispõe de rendimentos maiores ou menores, se veja cheia de dívidas. Por isso, é possível, sim, ensinar alguém a gastar bem o seu dinheiro, seja qual for a renda. O planejamento de gastos é a melhor dica para recuperar a saúde financeira.”

Ajudando a te ajudar

Na opinião da defensora pública, criar uma tabela com as despesas fixas (aluguel, condomínio e plano de saúde) e variáveis (água, luz, gás e telefone) do mês é uma pequena atitude, fácil e simples, mas que ajuda bastante na redução das despesas supérfluas.

Luiz Henrique, arquiteto de 41 anos que mora em São Paulo, aprendeu essa lição após acumular uma dívida que chegou a R$ 60 mil em cheques devolvidos, cartões de crédito e empréstimos bancários. Desde que ingressou no Devedores Anônimos (DA), em março de 2002, prometeu a si mesmo que, um dia, quitaria todas as dívidas. Cumpriu a promessa em 2006. Na mesma época, constatou, perplexo, que havia emagrecido quase 30 quilos no período.

“Depois de saldar as dívidas, resgatei também minha autoestima. Com isso, recuperei a saúde física e financeira. Hoje, procuro selecionar alternativas baratas de lazer que fazem bem ao corpo e ao bolso. Em vez de pagar uma academia de ginástica, por exemplo, pratico esportes em áreas de lazer”, afirma ele.

Flávia Regina, funcionária pública de 38 anos, também tem certeza de que peso e dinheiro estão interligados.

“Se a saúde financeira não vai bem, o corpo somatiza. Você passa a dormir o dia inteiro para tentar suportar a tortura. E, quando acorda, não tem disposição para nada. O sentimento de culpa é enorme”, recorda Flávia, que chegou a acumular uma dívida de R$ 23 mil.

“Passei a adotar hobbies que não envolvem gastos, como assistir a peças de teatro gratuitas e integrar uma companhia de dança folclórica. Desde que quitei minhas dívidas, já perdi 10 quilos, mas ainda quero perder mais três”, avisa Flávia, que tem 1,70 m e pesa 65 kg.

Dê prêmios a si mesmo

Nutricionistas, personal trainers e orientadores financeiros concordam com um aspecto: estabelecer metas é fundamental para emagrecer ou economizar. “Seja qual for o hábito que tentamos romper ou mudar, é preciso uma meta atraente para nos manter no bom caminho”, ensina Michael Burge, psicólogo comportamental.

“É mais provável atingir a meta quando estamos entusiasmados com a recompensa.” Para o educador e terapeuta financeiro Reinaldo Domingos é preciso ensinar as pessoas a priorizar os seus sonhos.

“As pessoas são movidas por objetivos. O problema é que, desde criança, se aprende a consumir e não a poupar. É preciso que se mude a forma de pensar e agir com relação ao dinheiro. Um sonho deve estar sempre acompanhado de seu valor, do quanto se guardará de dinheiro mensalmente para realizá-lo e em quanto tempo se pretende realizá-lo.

Devemos ter sempre sonhos de curto (até um ano), médio (até dez anos) e longo prazos (acima de dez anos). Priorizar os nossos sonhos e desejos é o segredo para que mantenhamos saudável a nossa vida física, mental e espiritual”, recomenda Domingos.